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Texto da entrada (ID.1161)

Na Sociedade Portugueza de Sciencias Naturaes de Lisboa e em sessão de 26 de maio de 1909 o Prof. Anibal Betencourt propoz que fosse nomeada uma comissão para estudar os ratos e pulgas de Lisboa, aditando o Prof. Souza Junior áquela proposta que identicos trabalhos se realizassem no Porto sob a égide da Sociedade. A Comissão para o estudo dos ratos e pulgas de Lisboa ficou constituida pelo citado Prof. Anibal Betencourt e mais os dr. Carlos França e naturalista Antero Seabra; a do Porto é composta dos srs. Prof. Souza Junior, dr. Manuel Pinto e naturalista Augusto Nobre.

O ministro do reino, a quem foi presente a troca de correspondencia entre o Governador Civil de Lisboa e a Camara Municipal da mesma cidade, na qual aquele funcionario solicitava d’esta instituição um serviço permanente de exterminio de ratos na capital, em harmonia com uma consulta do Conselho Superior de Hygiene, resolveu bem singularmente[1] esta questão. O seu despacho foi que, não havendo a necessaria verba no orçamento camarario do ano corrente, nem podendo a Camara diminuir as dotações para encargos obrigatorios, nem se tratando d’uma providencia urgente, reclamada pela defeza sanitaria, para que haja de dar-se combate imediato a uma epidemia de peste ou para prevenir um perigo eminente, forçoso é sobreestar na execução d’esta providencia, a qual será atendida no proximo orçamento ordinario, se antes não melhorarem as condições da Fazenda Municipal, ou a diminuição dos seus encargos permitir fazê-lo por meio de orçamento suplementar.

Referentemente a conferencias internacionaes e legislação sobre assumto o que vimos versando, vamos resumir o que conseguimos compilar.

A conferencia de Paris de 1903[2] (Delegado portuguez o Prof. Silva Amado) reuniu-se por convocação da Italia com representação de 25 potencias. Subdividiu-se em tres Comissões: technica, de vias e meios e de codificação.

Atendendo a que está demonstrado que os ratos são suscetiveis de adquirirem a peste e de contaminarem as coisas, com que estão em contacto, podendo ser a origem de epidemias e os agentes mais eficazes para a sua difusão, julgou-se necessario proceder á destruição d’estes roedores a bordo dos navios procedentes de portos contaminados.

Recomendou-se a destruição dos ratos não só nos navios infectados, ou suspeitos de peste, mas tambem nos indemnes, quando o exame bateriologico demonstrar que ha a bordo ratos pestiferos, ou ainda simplesmente quando se observar mortalidade insolita nestes animaes.

Deixou de haver os meticulosos cuidados com a agua do porão, por se considerar que a peste não se transmite por ela.

Tendo-se reconhecido que o periodo de incubação da peste não excede a 5 dias, egualaram-se os periodos de observação em relação á cholera e á peste, o que d’antes não sucedia.

O presidente da conferencia, que foi o embaixador de França junto do rei de Italia, propoz a creação de uma repartição internacional de saude, com o fim de colher as informações sobre a marcha das doenças infeciosas. Esta proposta foi aprovada pela Comissão de vias e meios, sendo marcada a séde da repartição em Paris. A conferencia tomou conhecimento d’esta conclusão, mas não resolveu nada sobre o assunto, reservando-se o governo francez a faculdade de fazer, quando fosse oportuno, as propostas, por via diplomatica, ás nações representadas na conferencia.

Em 1904 realisou-se no Rio de Janeiro uma Convenção entre o Brasil, a Argentina, o Uruguay e o Paraguay, ocupando-se principalmente da peste e febre amarela. – O artigo 9º d’esta Convenção Sanitaria diz o seguinte: “Deixará de ser contaminada a localidade, onde se tenham volvido 10 dias depois do ultimo obito ou do aparecimento do ultimo caso de qualquer das referidas molestias (peste, febre amarela, cholera), contanto que os doentes ainda existentes sejam convenientemente isolados”. É extraordinario que se marcassem 10 dias (!) como limite para ser declarada limpa uma localidade. É o erro de considerar a peste uma doença humana, contra a qual clama a notavel campanha do Rio de Janeiro.

A secção de medicina tropical do 16º Congresso internacional de medicina, realisado em Budapesth em 1909, aprovou unanimemente os dois seguintes votos:

1º - A secção de medicina tropical chama a atenção das nações sobre os novos perigos da propagação da peste e da cholera, que provêm da recente abertura do caminho de ferro de Hedschas, e propõe que o estudo d’este assumto seja confiado a uma Comissão internacional competente.

2º - Para obviar melhor à implantação na Europa das doenças infeciosas, especialmente provenientes da America, esta secção do Congresso internacional de medicina recomenda a revisão sanitaria de todos os individuos que regressem d’aquele continente.

Carlos Fortes


[1] Convem não esquecer que outro ministro, saido pouco antes dos conselhos da corôa, tinha reconhecido a urgente necessidade da desratização da capital; assim, ainda é mais frisante o destempero do despacho ministerial. Por isso é bem justa a nota que a proposito d’este incidente publicou A Medicina Contemporanea, de 9 de maio de 1909, e que integralmente transcrevemos com a devida venia: “O governo do Japão acaba de estabelecer um premio de 20 réis por cabeça de rato que nas estações de policia sanitaria sejam apresentadas, e ao mesmo tempo declarou livre a importação de gatos. Esta ultima disposição tem importancia, porque tende a contrariar uma manifesta má vontade que na sociedade japoneza havia contra os gatos, contra a qual começa a haver um começo de reviramento, pois já há em Tokio sociedades protetoras da introducção dos gatos e da sua familiarização, no que estão principalmente interessadas as senhoras , que são decerto garantia do exito d’esta propaganda gatofila. Na Terceira (Açores) a campanha raticida bateu o record das modernas campanhas sanitarias em Portugal contra os ratos, mas não chegou ao gatofilismo. Na Terceira, porém, a campanha subsidiada é de iniciativa particular e o governo... nem uma cauda de rato paga! Se nós apenas por ironia chamamos aos forasteiros japonezes!”.

[2] Vide A Medicina Contemporanea, de 20 de dezembro de 1903.


Referência bibliográfica

Carlos Fortes - "Do livro – A Peste Bubonica - A 2ª Campanha em S. Francisco da California - Contra a peste 1907-1908" in Diário dos Açores de 19 de Novembro de 1920, nº. 8639, p. 1 (col. 1). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=1161.



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