Do “Matin” de 9 de Janeiro. Expressamente traduzido para o “Diario da Madeira”:
Ao principiar o novo ano, em plena consciencia das minhas responsabilidades, eu venho afirmar a minha fé na vitoria próxima e completa da sciencia sobre o bacilo de Koch.
De todas as partes os laboratórios demonstram uma ardente actividade; as experiencias veem com provas, e propagam-se as indiscrições.
Hoje, assinalarei a descoberta d’um medico dinamarquês de quarenta anos apenas, o dr. Holger Mallgaard, professor de fisiologia-animal na Escola Veterinária de Copenhague.
Já os jornais ingleses e americanos se tinham apropriado da noticia e a tinham comentado. Mas têm-se tantas vezes ouvido, além Atlantico; fazer o reclamo de panaceias maravilhosas acabando pouco depois no ridiculo, que convinha para o caso muita circunspecção.
Encontrei o dr. Mallgaard em Paris. Voltava de Oxford onde tinha sido chamado para ensinar a sua descoberta. Vi um homem louro, alto, delgado, de olhar claro. Modesto nas suas palavras como no seu porte, ele expoz-me o seguinte:
O meu tratamento da tuberculose sob todas as suas fórmas, consta de dois medicamentos: um sal de oiro que denominei “sanochrysine” e um sôro animal.
Robert Koch descobriu que os sais de oiro eram tóxicos para os bacilos tuberculosos.
Eu achei uma composição inorganica, de aspecto branco cristalino, muito soluvel na agua, não toxico para o organismo, que é, quimicamente, um hiposulfito duplo de oiro e sódio.
Nos doentes que se encontram no início da infecção tuberculosa, a injecção intravenenosa [sic] da “sanochrysine” é bem suportada. Desde que a invasão bacilar é um pouco pronunciada, a destruição dos bacilos de Koch põe em liberdade, no sangue, toxinas altamente venenosas, e o doente apresenta reacções mais ou menos violentas: perturbações digestivas, febre, albumina, dôres articulares, erupções de pele, etc.
Estes acidentes apresentavam se sob uma fórma tão inquietante que me veiu a ideia de injectar ao mesmo tempo um sôro animal preparado para neutralisar estas toxinas um sôro contendo um contraveno [sic]. As experiencias fôram concludentes.
Na prática, logo que após a injecção de “sanochrysine” aparece um pouco de albumina nas urinas, utilisamos o sôro.
O principio fundamental do novo tratamento está na judiciosa combinação dêstes dois remédios.
Primeiras observações
Quando apresentei os meus trabalhos à Academia de Medicina da Dinamarca, tinha já reunido observações demonstrativas.
O tratamento pelo medicamento em questão foi ensaiado em novembro de 1922, no hospital de Bispebjerg, de Copenhague, pelo Dr. K. Secher; depois já aperfeiçoado, foi adaptado pelo Dr. Wurtzen, chefe de serviço no hospital de Oresund, pelo Strandgaard, chefe de serviço do Sanatório de Boserup, pelos drs. Ruyn e Chieewitz, chefes de serviço do instituto de radiologia Finsen, pelo chefe de serviço Permin, do hospital de Frederiksberg e pelo professor Bie, do hospital de Bregdam.
D’este modo um certo número de médicos trataram simultaneamente mais de trezentos doentes.
Todos estes casos demonstram o alto valor da “sanochrysine”.
Contudo, se temos triunfado em todas as formas da tuberculose – tanto na criança como no adulto, e á condição das lesões não terem destruido os orgãos essenciais á vida, não é caso para se gritar “Milagre”
Estamos apenas no principio e pedimos a todos que tenham um pouco de paciencia.
Posso assegurar uma preparação rigorosa, em quantidade suficiente, de “sanochrysine”, que ofereço á Humanidade, sem querer ganhar com ela um cêntimo em proveito próprio.
O sôro é preparado no Instituto Seroterapia Dinamarca. Todas as precauções são tomadas para que ninguém possa enriquecer pela venda do remédio. Actualmente uma cura vem a custar 120 coroas dinamarquezas.
Um tratamento que póde ser perigoso
É necessario que diga aos seus leitores que, nos casos graves, o tratamento é muito perigoso. É comparavel a certas intervenções cirúrgicas desesperadas que se tentam mesmo com riscos de matar o doente.
Quando um tuberculoso está carregado de bacilos, a actuação da “sanochrysine” provoca uma tal invasão de toxinas que o organismo, apesar do soro, não pode resistir-lhe.
Eis o motivo porque o tratamento não póde ser aplicado e dirigido se não em estabelecimentos especiaes, por médicos conhecendo perfeitamente a toxicologia, a patologia e a clinica modernas.
(o tratamento tem sido seguido por médicos do mundo inteiro)
Dr. Pierre-Louis Rehm
Dr. Pierre-Louis Rehm - "Numerosos sábios esperam vencer a tuberculose em 1925 - Uma primeira vitoria: O metodo do doutor dinamarquez Holger Mollgaard"
in Diário dos Açores
de 17 de Março de 1925, nº. 9894, p. 1 (col. ). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=1180.