ASSUMPTOS DO DIA
Exercicios physicos
A marcha e a equitação são dos mais saudaveis exercicios physicos, mas estão hoje um pouco em decadencia graças á rapidez e facilidade dos meios de transporte e locomoção. Em Lisboa anda-se pouco a pé devido aos trens, aos americanos, aos elevadores e a toda a casta de vehiculos. Ainda se faz a pé a Avenida, mas quanta gente não preferiria fazel-a de carro! Esta facilidade e multiplicidade de transportes n’uma terra como a nossa capital, tão rudemente accidentada, representa com effeito um grande commodo, mas por outro lado tira-nos a agilidade e evita que façamos o exercicio indispensavel para a regularidade das funcções e portanto para o desenvolvimento do organismo.
O que se dá na cidade vae-se repercutindo nas aldeias. O lavrador, desde que tem a estrada de ferro ou carros da carreira lhe passam á porta, já não tem tanto capricho na sua egua. Antigamente, não havia nada mais pittoresco que os enormes ranchos que se dirigiam ás romarias, cantando e dançando continuadamente pelo caminho. Hoje a locomotiva é que faz o barulho com a sua orchestra de tambor e assobio. Á equitação succedeu o cyclismo; o cavallo de carne e sangue foi substituido pelo cavallo de aço. O velocipede é um excellente meio de transporte, mas o pedalismo está longe de valer, como exercicio physico, a equitação, havendo até muitos hygienistas que o condemnam como prejudicial.
Os dois exercicios que acabamos de apontar, sobretudo a marcha, são para assim dizer naturaes, mas além d’estes tinhamos outros de invenção humana, a que melhor cabe o nome de jogos, e que hoje são designados pela expressão ingleza sport. Alguns d’esses, outr’ora tão vulgares entre nós, como o da pella, desappareceram quasi por completo. Hoje ainda é commum, e de caracter popular, o chinquilho, mas este é pena que se arme de ordinario á porta das tabernas e dos retiros, liquidando se sempre em vinho os lucros e perdas. Assim se damnifica nas frequentes libações o que se adquirira em tão prestimoso exercicio. / Em toda a peninsula o espectaculo predilecto, verdadeiramente nacional, é o combate de touros, a corrida.
Na Hespanha a tauromachia é uma instituição, um poder de estado, uma religião. Tirem á Hespanha as suas praças de touros e ella perderá o seu pittoresco, a sua poesia, a sua inspiração. A pintura hespanhola empallideceria se lhe negassem a faculdade de reproduzir o toureiro e todo o fulgurante cortejo de typos que o rodeiam.
A tauromachia tem um defeito como exercicio physico e é ser peculiar d’uma classe relativamente pouco numerosa. O publico não toma parte directamente na lide e assiste apenas a ella como espectador. É uma arte que tem cultores especiaes. O toureiro é um artista na arena como o actor é um artista no palco. Não pode ser por conseguinte um exercicio educador. Ha mesmo quem o condemne como desmoralisador, como improprio da civilisação, como sugestivo apenas de sentimentos sanguinarios. Os estrangeiros chamam-lhe barbaro, mas esses estrangeiros de tão melindroso paladar não se lembram de que teem lá o jogo do box, que é tudo quanto ha de mais brutal sem offerecer nenhum dos attractivos e seducções d’uma praça de touros.
Dois exercicios que entre nós conviria generalisar o mais possivel seriam a natação e o remar. Á camara municipal incumbiria muito directamente crear escolas de natação, que seriam ao mesmo tempo casas de banhos.
Somos partidarios de todos os exercicios physicos, executados com regularidade e a preceito, com moderação e não com excessos. A nossa raça, mórmente nas cidades, está definhando a olhos vistos, e carecemos de a revigorisar e de a reconstituir. Tornemo-nos fortes, não para ter superioridade physica sobre os nossos similhantes, não para nos combatermos uns aos outros, como feras irreconciliaveis, mas para manter o organismo n’um perfeito equilibrio, para termos as forças indispensaveis para o trabalho, para conservarmos o espirito são n’um corpo são, para gosarmos emfim [sic] de inalteravel saude, da saude que é o melhor prazer e a maior felicidade na terra.