Atheneu Commercial de Lisboa

A conferencia do sr. dr. Ferreira Ribeiro

Este distincto clinico da armada continuou hontem no Atheneu commercial de Lisboa, a annunciada serie de conferencia [sic] acêrca das observações e factos clinicos que justificam os meios hygienicos, prophylacticos e antisepticos já divulgados pelo conferente em diversas publicações; plena confirmação dos principios de hygiene colonial; actuaes culturas nas ilhas de S. Thomé e Principe e em Angola; causas que as difficultam; urgencia de novas explorações agricolas e industriaes, etc., etc.

A sala estava repleta de senhoras e cavalheiros, e ás 8 ½ horas da noite o sr. dr. Ferreira Ribeiro começou a sua conferencia por expôr a razão que o levou a iniciar aquelles trabalhos, a qual tem por fim indicar os meios praticos de adaptação individual nas regiões equatoriaes.

Faz diversas considerações sobre as condições climatericas da nossa provincia de Angola; prova por uma fórma clara, como é erronea a ideia que no continente se faz a respeito da acção do clima nas regiões africanas; cita Benguella, Loanda e Mossamedes, como pontos onde o clima é esplendido.

Parece que o principal fim do illustre conferente é estudar o regimen pathologico das regiões da nossa Africa Occidental, tornando-se por esta fórma util ao paiz e á sociedade.

Explica scientificamente a origem e o germen das doenças mais accentuadas n’aquellas regiões, taes como a peste, a tuberculose, a febre typhoide e outras, referindo-se a um parasita vulgar e pernicioso – a pulga – e á lucta a encetar para conseguir a sua extincção.

Mostra a necessidade de combater o malario, microbio que nasce no solo e que morre no homem, chamando a attenção do auditorio para este mal. Cita os nomes dos sabios mais illustres que se teem occupado do terrivel microbio e entre elles Treille, o qual affirma que as febres d’Africa são devidas á má alimentação, e especialmente ao abuso de carnes, alcooes, etc. Combate as opiniões d’aquelle sabio estrangeiro, provando que não é apenas a alimentação a base d’estas doenças.

Falla de Koch o notavel sabio allemão, que, no seu relatorio referente á Africa allemã, diz estar a origem da molestia nos saes de quinino. N’este ponto é contraria a opinião do conferente.

Refere-se tambem ao dr. Legrand que assevera não existir parasita algum, mas apenas uma alteração ou perturbação dos globulos sanguineos. Disse o dr. Ferreira Ribeiro que, em vista das divergencias citadas, teve que abandonar todas as theorias, entregando-se apenas aos seus estudos, de que resultou chegar a conclusões differentes das dos illustres medicos estrangeiros. Entende o conferente que o sulphato de quinino é o unico remedio capaz de salvar o europeu do terrivel flagello.

Na segunda parte da sua conferencia descreve o dr. Ferreira Ribeiro a resenha das primeiras expedições maritimas portuguezas, e das tentativas feitas no sentido de desenvolver a agricultura.

Prova que essas tentativas foram infructiferas pela improficuidade das plantas das zonas temperadas nas zonas equatoriaes, referindo-se com numeros muito elucidativos ao desenvolvimento da cana sacharina, do café, e do cacau. Qualquer d’estas plantações tem a sua região determinada. Refere-se ás plantações de cacau, trabalhos desenvolvidamente estudados pelo barão de Agua Izé, o sr. João Maria de Sousa e Almeida, e publicados no «Boletim official da Provincia» em janeiro de 1858.

N’este ponto o conferente teve palavras de merecido elogio para o filho d’aquelle titular, que tem seguido os mesmos trabalhos com igual enthusiasmo. O orador lastima o facto da falta de attenção para a cultura do cacau, especialmente na ilha de S. Thomé, onde a producção representa uma verdadeira riqueza, pois que no ultimo anno attingiu a importante somma de 2:700 contos de réis.

Depois de outras considerações ácerca d’este importante assumpto e da necessidade da prophylaxia, cita as regras concebidas pelos seus estudos, sendo alvo dos maiores applausos ao terminar tão brilhante exposição.

[NOTA - A realização do evento foi anunciada na edição n.º 12542 do Diário de Notícias, de 4 de Novembro (p. 1, c. 5)]