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Texto da entrada (ID.1543)

COMETAS

O cometa de Halley e o cometa de Drake

Uma palestra com o sr. vice-almirante Campos Rodrigues, director do observatorio da Ajuda – O cometa visto em Portugal não é o cometa de Halley – O cometa de Halley envolvendo a Terra com a sua cauda, não conseguirá incommodar-nos sériamente, antes pelo contrario, póde ser elle o incommodado – Opinião do sabio e a opinião do philosopho – De qualquer maneira não ha motivos para sustos

Inquestionavelmente, ha duas coisas que n’este momento preoccupam de preferencia as attenções dos habitantes da terra, e são ellas o resultado das eleições em Inglaterra e as consequencias da approximação do cometa de Halley, do globo terraqueo, facto, que, segundo os entendidos, deve produzir-se ahi pelos meiados [sic] do mez de maio proximo.

Ora, emquanto [sic] decorre este compasso de espera, aliás relativamente curto, e visto que tanto se tem já dito sobre o futuro acontecimento, parecendo-nos conveniente ouvir ainda a opinião dos sabios e dos entendidos no assumpto, tanto mais que nem sempre são absolutamente concordes as opiniões até agora expostas.

Procurámos portanto o sr. vice-almirante Campos Rodrigues, director do observatorio d’Ajuda, anciosos [sic] por ouvir as a opinião do illustre homem de sciencia, que é justamente considerado um sabio, não só no paiz, como ainda no estrangeiro e talvez ahi muito mais, pois são lá melhor conhecidos os seus valiosos trabalhos scientificos.

Responderam-nos que o sr. Campos Rodrigues, acabadas umas observações a que estivera procedendo, retirara para casa bastante incommodado. Mas, como a missão do jornalista chega por vezes a ser cruel, pois que o publico por consideração alguma lhe desculpa a falta de informações que lhe interessem, mesmo assim insistimos em falar ao velho marinheiro, que, pondo de parte o seu incommodo de momento, teve a gentileza de nos receber.

- V. exª já adivinhou, certamente, o motivo que nos levou a procural-o. Não é verdade?

- Sim. Calculo. Provavelmente trata-se dos cometas...

- Do cometa.

- Mas de qual ?

- De qual?

- Sim, do que foi visto hontem, ou do de Halley?

- Então não são ambos a mesma coisa?

- Não senhor.

- Então este, o que foi visto hontem, como se chama?

- Drake.

- E que nome é esse?

- É o nome do descobridor.

- E o que nos pode dizer sobre elle?

- Pouco lhe posso dizer. Ha tres dias que eu tenho noticias d’elle.

- E de onde vieram vieram essas noticias?

- Da Allemanha.

- Então foi lá que o viram a primeira vez?

- Não. Já havia noticia d’elle dada da Argentina, segundo me parece, da Africa do Sul, etc.

- Mas este cometa é tão importante como o de Halley?

- Não lhe posso dizer, porque, como já declarei, são poucas as noticias que temos a seu respeito, tanto mais que os telegrammas são feitos com uma cifra bastante dificil.

- Mas, voltando ao cometa de Halley: o que nos pode dizer v. exª dizer a tal respeito?

- Pouco lhe posso dizer além do que já está dito.

- Cá no observatorio já o viram?

- Ainda não. Os nossos apparelhos são pouco poderosos para isso. Mesmo a maneira mais facil de o observar é a photographia.

- Não sabiamos…

- Sim sr. E o caso explica-se: Bem vê que a photographia conserva-se a «olhar» para o astro o tempo que fôr necessario. Emquamto que nós não podemos conservar-nos a olhal-o por muito tempo.

- Então tambem ainda não tiraram photographia nenhuma?

- Ainda não. Essas photographias são trabalhosas. Não levam menos de quatro horas a tirar. Alem disso a nossa especialidade não é o estudo dos cometas; temos outros trabalhos a que damos preferencia.

- Em todo o caso, com o conhecimento que v. ex.ª tem do assumpto, póde dizer-nos se a approximação do cometa de Haley [sic] terá perigos para os habitantes da terra?

- Ah! sim! eu não tenho lido os jornaes, mas consta-me que alguns delles teem espalhado boatos terroristas. Mas segundo eu creio, esses boatos não tem rasão [sic] de ser.

- Não ha entao perigo algum a recear?

Não ha. Em primeiro logar não existe ainda a certeza de que a terra seja envolvida pela cauda do cometa. Em segundo logar, quando mesmo o seja, essa cauda é constituida por materia tão tenue, que nenhum desastre póde causar á terra. Antes pelo contrario, o cometa é que pode ser o prejudicado.

Se o cometa propriamente dito chegasse a tocar na terra, então sim; n’esse caso podia acabar-se o mundo, embora se se [sic] não acabasse grande coisa.

- De certo não é a primeira vez que o facto se dá. Não é verdade?

- Não senhor. Cometas ha-os todos os annos, pelo menos dois ou trez. Mas como são menos visiveis, a imprensa não se occupa delles e passam desapercebidos [sic]. Mas creia que a familia é muito numerosa.

Provadas mais algumas ligeiras impressões, aludimos mais uma vez aos incommodos do sr. Campos Rodrigues, notando que o local do observatorio é bastante frio, ao que elle nos respondeu:

- Aqui faz frio, faz calor e faz tudo. Isto é a tapada mas destapada que se tem visto.

Sabio, philosopho e espirituoso!

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Madrid, 22. – Esta noite viu-se aqui distinctamente o cometa Halley. – (Correspondente).

Azambuja, 22. – Pelas 6 horas da tarde de hontem, foi aqui visto o cometa, que causou enorme sensação.

Hoje, ás 5 ½ da tarde, muitas familias da villa estão pelas janellas e ruas a fim de verem se avistam novamente aquelle phenomeno.

Hoje de tarde, proximo da noite pessoas houve que ao verem apparecer a estrella, começaram logo dizendo que era o cometa. Este assumpto é aqui muito falado.

Ceia, 22. – Hontem logo depois do por do sol divisou-se durante perto de meia hora, um brilhante cometa com grande cauda, desapparecendo depois. – (H.)

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Porto, 22. – Viu-se hoje pela primeira vez, ás 6 horas da tarde, no horisonte, o cometa que todos presumem ser de Halley, que apresenta uma cauda enorme.

Nos pontos mais elevados da cidade juntaram-se numerosas pessoas a ver o phenomeno.

Coimbra, 2é. [sic] – Foi vista n’esta cidade uma estrella de cauda bastanre [sic] luminosa.

Muita gente ficou assustada, suppondo ser o cometa Halley, cuja cauda será tocada pela terra, segundo se annuncia.

Guimarães, 22. – Pouco depois das 6 horas da tarde, viu-se a poente d’esta cidade um cometa que deu origem a que muitas pessoas se juntassem no largo do Toural a presencial-o.

Muita gente anda aterrorisada com a noticia do que se deve presenciar em 18 de maio.

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Torres Vedras, 22. – Hoje, pouco depois do sol posto, foi visto o cometa Halley, perfeitamente distincto, a oeste, e ainda a alguns graus acima do horisonte. A cauda em sentido vertical e para cima, attingia uma altura extraordinaria. Um nosso amigo que tinha ido de proposito ao castello ver se o descortinava, apenas o avistou nitidamente por uma nesga que as nuvens abriram, desceu logo á villa a convidar alguns amigos a irem gosar o espectaculo. Infelizmente, toldou-se de novo o ceo, e mal se entreviu um clarão indeciso, que meia hora depois se sumia no horisonte.

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Santarem[,] 22. – Devido ás nuvens que se viam na direcção do poente, ao pôr do sol, não se poude [sic] hoje disfrutar aquelle phenomeno.


Referência bibliográfica

[n.d.] - "COMETAS / O cometa de Halley e o cometa de Drake" in Diário de Notícias de 23 de Janeiro de 1910, nº. 15874, p. 5 (c. 1-2). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=1543.



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