[Crónica que integra três fotografias: uma do edifício da Sociedade de Geografia, onde se realizou ao COngresso, outra do edifício da Liga Naval, onde foi feita a recepção aos congressistas, e uma terceira de um aparelho para registo da velocidade dos ventos]

Fizeram-se preces e com franqueza não applaudimos que se tivesse gasto tanto latim e tanto incenso, tanta cera e tanta devoção, apesar da agricultura clamar por agua e apesar dos generos irem a encarecer. Não applaudimos...
E isto porque n'essa semana ida, careciamos mais do que nunca d'um sol forte, incandescente e vivo, d'um céu bem azul, d'um delirio de luz.
Mas, fizeram-se preces e todas essas orações foram d'uma grande indelicadeza.
Vieram ahi os congressistas, vieram em revoada por este maio de encantos, chegaram com as suas malas com as suas memorias para o congresso, e com os seus desejos de conhecer as maravilhas da nossa terra.
Foi, por conseguinte, uma tão grande falta de gentileza pedir chuva, como seria o fechar-lhes as portas da Sociedade de Geographia ou da Liga Naval. Elles que deviam passear-se no Tejo sobre as aguas serenas e azues, sob o céu magnificente que ´eum docel sem uma prega por este mez sublime, encontraram apenas um rio barrento, a rolar, a encapellar-se, um rio guloso a querer-lhes engulir as bagagens e os corpos, umas aguas pouco hospitaleiras que lhes deram a idéa de haver uma sublevação entre os peixes, no momento cheios de zanga, ao verem-se classificados pelos illustres congressistas, um rio que lhes fez enjôos, nauseas, que sobretudo os obrigou a escrever nos seus albuns: Tejo: rio de Portugal que é como certas mulheres. Tem fama de bello e é horrivel, dizem-no condescendente e azul, mas em verdade é barrento e malcreado.mas é preciso salvar a todo o trranse a rica reputação do nosso bello rio.
Depois havia esse passeio a Cintra, á Cintra que lá fóra se conhece pelas leituras do Byron e pelas anedoctas de inglezes, havia esse almoço com regatos de Champanha ao ar livre, entre arvores e defronte dos penhascos, com passaros cantando e mulhersinhas loiras, vestidas de claro, mostrando trechos de meias ao arregaçarem-se para saltarem vallados, havia aquella linda volta pela campina até Cascaes, em carros, com canções frescas na excitação do almoço, por um poente rubro, listrado, que devia annunciar calor, a rasgar-se detraz do Castello dos Mouros, ameiado e historico.
Tudo isso se desmancharia com a chuva e levaria os senhores congressistas a fazerem de Cintra um mau juizo, a escreverem nos seus albuns por debaixo da reprimenda ao Tejo:
Cintra. ok! Já não é mesma de Byron. [...]
Logo n'esta semana pediram a chuva! Que ferro...Não fomos completos nos festejos aos congressistas. Mas dirão agora: e o commercio, a agricultura?!
A agricultura viveria do mesmo modo a esperar uns dias, o commercio continuaria a girar. Encarecem ás vezes os generos por causa das guerras, das tricas politicas, das dôres de cadeiras d'um magno fornecedor. Que demonio, sempre pagamos!
D'esta vez pagariamos tambem. Mas ao menos deixassem-nos durante uma semana ter o orgulho de ouvirmos em todas as linguas:
- Que bello clima!
- Que soberbo céu.
- Oh! que aguas tão mediterranecamente azues...
preferiamos tudo a essas preces que deram a chuva.
Queriamos ter mostrado o nosso riquissimo clima, embora depois encarecessem as batatas!