Base de Dados CIUHCT

Divulgação Científica em Jornais



Texto da entrada (ID.1720)

Papagaios volantes

Precaução a tomar contra a ruptura do cabo de sustentação

O coefficiente de segurança, que, como já aqui dissémos, parece convir para o cabo dos papagaios, é o coefficiente 3; todavia, em virtude das fortissimas tracções a que dão logar ás rajadas, torna-se necessario empregar disposições especiaes que as attenuem evitando que o cabo se parta em consequencia d’esses esforços anormaes.

Batut preconisa o emprego d’um intermediario de cautchuc entre o cabo e as redeas que em virtude da sua elasticidade não tende bruscamente o cabo, transmittindo-lhe, sem choque, o esforço supplementar provacado [sic] por algum augmento brusco da intensidade do vento.

Outro processo consiste em fazer avançar o ponto de ligação e que permitte diminuir a incidencia e portanto attenuar o valor da pressão do vento sobre o papagaio.

Com effeito, a pressão do vento sobre uma superficie é maxima quando esta é normal á sua direcção, e vae diminuindo á medida que ella se inclina sobre a direcção do vento. Ora o avanço do ponto de ligação ou o que vem a ser o mesmo, o alongamento do braço inferior das redeas do plano de symetria do papagaio, (ou de dois ou mais braços inferiores, symetricamente collocados em relação áquelle plano), fazendo inclinar o papagaio sobre o vento, diminue o valor da pressão do vento sobre o papagaio, e, por consequencia, a tracção que este exerce sobre o cabo de sustentação.

O avanço do ponto de ligação póde obter-se por dois processos: intercalando entre o cabo e as redeas um fio delgado que recebe a pressão do vento, e que partindo-se, desde que este attinge um certo valor, manobra um gatilho que faz avançar o ponto de ligação; ou empregando redeas elasticas que permittam regular, automaticamente, a sua posição.

O primeiro processo não é aconselhavel, visto que altera de um modo permanente as condições de equilibrio do papagaio, depois de haver funccionado, mesmo que a causa haja desapparecido; tal é o caso vulgar d’uma rajada.

O emprego das redeas elasticas deve ser preferido.

No boletim do observatorio meteorologico de Blue-Hill encontra-se um exemplo que mostra bem a sua efficacia.

Dois papagaios, dos quaes um apenas era munido de redeas elasticas, foram lançados com um vento de 80 kilometros á hora.

O papagaio munido de redeas elasticas tinha estas reguladas por fórma a não permittir que a tensão do cabo excedesse 5 kilogrammas por metro quadrado de superficie sustentadora do papagaio, e, effectivamente durante a experiencia, nunca essa tensão foi succedida, ao passo que o outro papagaio, durante o mesmo tempo, exerceu sobre o cabo de sustentação uma tensão media de 40 kilogrammas por metro quadrado de superficie sustentadora.

Quando convenientemente reguladas, as redeas elasticas, permittem assim limitar á vontade a tensão maxima do cabo de sustentação.

Vejamos agora, rapidamente, como funccionam as redeas elasticas.

Com os ventos ordinarios a tensão do cabo reparte-se entre os dois braços o A e o B das redeas, dos quaes apenas o braço B é elastico (fig. 1). Quando o vento sopre violentamente o braço elastico B alonga-se e quasi toda a tensão é supportada pelo braço A, ligado á parte anterior do papagaio, inclinando-se este tanto mais sobre a direcção do vento, quanto mais violento elle fôr (fig. 2).

Emile Veuz emprega um systema de redeas elasticas muito recommendavel (fig. 3).

Duas correias C, e de côrca [sic] de 0,m02 de largura, munidas de um furo na extremidade, abraçam um numero variavel de anneis de cautchuc A, a de 0,m10 de diametro. A secção do cautchuc é circular com um diametro de cerca de 0,m008. Um fio ff’ munido de dois nós, n e n’, distantes um do outro, limita a maxima distancia dos anneis e serve simultaneamente de fio de segurança no caso de ruptura dos anneis.

Este systema, além de simples, apresenta a vantagem de se poder regular com a maior facilidade a força do cautchuc, para o que basta abraçar pelas correias um numero maior ou menor de anneis.

* * *

Além de ser condicção de desclassificação no proximo concurso de papagaios, a ruptura do cabo de sustentação póde ter graves consequencias como mostra o seguinte accidente occorrido em Berlim em 1900 e relatado, em nota, por Marchis o seu livro «Leçons sur la navigation aerienne».

Cinco papagaios aucteorologicos Hargrane de 13m2 [sic] de superficio [sic] quebram o cabo de sustentação do grupamento, sob um vento de 12 a 13 por segundo.

A extremidade livre do cabo passando sobre um jardim a N.E. de Berlim, fórma tres anneis em volta da perna de um rapaz e corta-lh’a até á tibia; uma mulher tocada levemente pelo cabo recebe um grande ferimento na cara, muitos homens ficam com o fato rasgado e um cavallo é derruba[do] e ferido n’uma rua da cidade. Em 24 horas, os papagaios percorreram 140 kilometros, sendo encontrados no dia seguinte em Lausitz, ainda voando e conservando intactos os seus apparelhos registradores.

Se o cabo de sustentação é metallico póde ainda ir ao contacto com conductores onde passem correntes de alta tensão e occasionar graves accidentes.

Por aqui se vê a necessidade e a importancia de evitar por todas as fórmas a ruptura do cabo de sustentação dos papagaios.

Tancos, fevereiro de 1910.

Pedro F. Ribeiro d’Almeida

(Do Aero-Club de Portugal)

[NOTA - Não obstante a referência, no artigo, a 3 imagens, o jornal só publicaria uma, a figura 3, que aqui consta em anexo]


Referência bibliográfica

Pedro F. Ribeiro d’Almeida - "Papagaios volantes" in Diário de Notícias de 11 de Março de 1910, nº. 15920, p. 7 (c. 3). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=1720.



Detalhes


Nome do Jornal


Mostrar detalhes do Jornal

Número

Ano Mês Dia Semana


Título(s) do Artigo


Título

Género de Artigo
Opinião

Nome do Autor Tipo de Autor


Página(s) Localização do Artigo na(s) página(s)


Tema
Vida Urbana
Outros

Acidentes, Riscos e Anomalias
Outros
Palavras Chave


Notícia