O COMETA DE HALLEY
O «Petit Journal» de 12, dedicou o seu artigo editorial ao sensacional acontecimento que se prepara para 18 de maio proximo, ás 5 horas da tarde.
O seu redactor Henry Spont, dá ali nota ao milhão e meio de leitores da folha parisiense da opinião do celebre astronomo abbade Moreux sobre o assumpto.
D’esse interessante artigo, recortámos o seguinte:
«Quando falo do encontro do cometa, com a Terra, é simplesmente maneira de falar. Os dois astros, que não giram no mesmo sentido, encontrar-se-hão a 22 milhões de kilometros. Para planetas, a distancia é pequena, porque tudo é relativo e no espaço, os milhões de kilometros, não contam.
Mas se o nucleo do cometa deve poupar-nos, poderá ser que a cauda nos envolva, ou por outra que nós penetremos durante duas horas na sua athmosphera [sic].
Ora, as caudas dos cometas attingem por vezes, extensões inverosimeis, a julgar apenas pelo do de 1843, que media pelo menos, duas vezes a distancia da Terra ao Sol.
Além d’isso, a athmosphera d’estes astros contem carboreto de hydrogenio, azote, uma quantidade d’elementos de que a sciencia não poude [sic] ainda determinar exactamente a composição. Esta athmosphera rarificada seria provavelmente cruel para os nossos pulmões, apesar de ser prematuro affirmar que contenha gazes venenosos».
O celebre astronomo abbade Moreux, disse ao articulista o seguinte:
- «O fim do mundo! Quantas vezes, no decorrer da historia, este terror preoccupou a imaginação dos nossos rudes antepassados! E como elle era legitimo, esse terror que parece hoje ridiculo ao nosso orgulho, enebriado por conquistas muito rapidas.
Não devemos censurar os nossos antepassados. É a elles que devemos o que somos.
Trabalharam segundo a medida dos seus meios, para nos tornar a vida mais doce e mais facil.
Preparam as estradas onde hoje caminhamos a passos largos.
Do embrutecido exercito do instincto, fizeram lentamente sair o homem que medita, que compara, que calcula – e que ama. Sejamos mais modestos, prestemos-lhes justiça...
«Tinham razão para assustar-se, porque não sabiam.
«O nucleo do cometa não nos attingirá e a sua cauda, mesmo se nos tocar ao de leve, será inoffensiva.
Mas, sopponhamos [sic] que o nucleo chegasse a ter contacto com a terra! Um projectil de 278 biliões de toneladas, carregando sobre Paris, com uma velocidade de 60 kilometros por segundo!
Que abominavel cataclismo, que esmagamento!
Seriamos instantaneamente pulverisados, reduzidos a migalhas, em pó. Seria então o fim do mundo, para nós, pelo menos, ou para os milhões de entes habitando a parte exposta do choque. Porque a Terra, não seria completamente aniquilada. É mais densa que o cometa e resistiria.
Não importa isto, para que as consequencias do choque se fizessem sentir em todo o mundo: os mares levantar-se-iam invadindo o sólo; as montanhas entrariam no centro da Terra, emfim [sic], por toda a parte a ruina e a desolação.
E a humanidade desarmada contra este flagello, procuraria em vão um refugio contra a morte!
Seria na verdade o fim do mundo, d’este pobre mundo em que a vida, apezar das suas lutas e das suas crueldades, é tão preciosa para quem sabe comprehendel-a e amal-a.
D’este drama que se passará no espaço, tão perto relativamente de nós, nada se verá. Só os astronomos poderão com os seus instrumentos observar-lhe a marcha silenciosa.
Mas esta observação não será, como poderia julgar-se, um simples divertimento de sabios destinado a fazer admirar o publico. Terá para o futuro, consequencias.
Permittirá penetrar um pouco mais no dominio das forças mysteriosas que nos guiam ou que nos ameaçam. Fornecer-nos-ha indicações e porá armas entre as nossas mãos. E, se mais tarde um cometa deve realmente entrar em contacto directo com a Terra, saberemos, pelos nossos calculos prevêr o perigo e só a elles se exporão os que ficarem no sitio de antemão conhecido em que deve dar-se a conflagração.
O cometa de Halley não é, como se sabe, o mais antigamente conhecido.
Antigamente, pensava-se que os cometas eram astros errantes, vagabundos do espaço «segundo a sua vontade».
Alguns livros propagam ainda esta heresia, reduzida a nada pela sciencia.
O cometa de Halley, foi o primeiro estudado scientificamente. Evola sobre um plano inclinado de 18 graus approximadamente sobre o plano que a terra percorre em torno do sol.
Sabe-se que, para que um encontro seja possivel, é necessario não só, que as duas curvas se cruzem, mas ainda que os dois astros cheguem ao mesmo tempo ao ponto de cruzamento. Sabe-se tudo isto e outras cousas.
«Halley, era um astronomo inglez, Impressionado pela descoberta da attracção universal do seu illustre compatriota Newton, chegou, graças aos seus calculos, a determinar exactamente a periodicidade deste cometa.
Os acontecimentos justificaram as suas previsões.
Morrem cedo de mais, para gosar do seu triumpho, pedindo apenas á posteridade para que no caso de successo: «se lembrasse delle».
Vê-se que a posteridade se lembrou.