A cura da tuberculose
O dr. Sabourin, director do Sanatorio de Durtal (França), condensou em um volume de 320 paginas o tratamento racional da tysica.
A cura do ar, diz elle, é o mais importante de todos os meios therapeuticos. Ella consiste em conservar os doentes durante todo o dia em varandas largamente abertas, ao menos por uma das faces e em fazel-os passar a noite em quartos que nunca estejam completamente fechados.
A installação durante o dia é variavel. Uma tenda, um kiosque, uma cabana qualquer, abrigados do vento e abertos para o lado do sol bastam. Quando o tempo estiver firme póde o doente conservar-se fóra de casa, deitado em uma cadeira preguiçosa e abrigado apenas por um guarda-sol ou pela sombra de uma arvore. A cura deve durar muitas horas por dia.
A noção da cura ao abrigo dos raios directos do sol é muito importante. A maior parte dos tuberculosos são mais ou menos predispostos á febre e a acção directa dos raios solares provoca reacções febris. Querendo-se que um tuberculoso tenha febre, basta expol-o ao sol durante algum tempo. A longa exposição ao sol póde tambem provocar congestões pulmonares nos tysicos.
Sabourin resume a sua opinião n’este conselho: o doente deve vêr a luz do sol, mas não deve ser visto por elle.
A cura do ar faz-se em todo o tempo, quer chova ou faça sol.
O leito deve ficar o mais longe possivel da janella do quarto de dormir e é preferivel que os pés da cama fiquem voltados para a janella. Esta deve ficar aberta, de cima a baixo, em toda a extensão. É o meio mais eficaz de conseguir uma troca perfeita entre o ar do interior e do exterior.
Ha vinte e cinco annos que Sabourin submette todos os seus doentes febricitantes ou não, a esse regimen de janellas abertas sem o menor inconveniente. Quando o doente não está habituado consegue-se acostumal-o abrindo a janella no primeiro dia 5 centimetros, no segundo 10, no terceiro 20, 30, 40, etc.
No inverno o doente será sufficientemente agasalhado, tendo junto aos pés uma botija de agua quente. Póde assim affrontar todas as intemperies, quer chova, vente, ou chuvisque.
Em regra geral, o regimen da janella aberta é sufficiente para supprimir os incommodos de que se queixam alguns doentes, agitação, sonho, pesadelos, acompanhados de suores nocturnos. Os que tossem muito, tossirão menos e os que teem insomnia dormirão melhor.
O doente desperta pela manhã n’uma atmosphera fresca, sem ter a bocca e o nariz seccos. Sente-se bem disposto.
Esta hygiene especial é applicavel aos tuberculosos ainda fortes e aos tysicos. É o melhor meio de curar os curaveis e de adoçar as miserias dos tysicos, mais cedo ou tarde condemnados á morte. O proprio cachetico, que já não tem forças para se levantar do leito e deixar o quarto, encontrará nesta pratica um bem estar que o forçará a agradecer ao medico que tal pratica lhe impuzer.
Ao lado da cura do ar, Sabourin colloca a cura do repouso, que segue immediatamente aquella no tratamento da tuberculose. O repouso deve ser physico e intellectual.
Quanto ao ultimo os seus conselhos são os seguintes:
Leituras intermittentes de comprehensão facil.
Correspondencia a mais curta possivel, mesmo a da familia.
Pequenos trabalhos manuaes utilisados sómente como distracção do espírito. (N’este particular as senhoras são mais aquinhoadas).
Divertimentos tranquillos e pouco prolongados.
É preciso, pois, excluir tudo que provoque uma attenção sustentada no cerebro. As discussões prolongadas são banidas e da mesma fórma as conversações animadas ao lado do doente. Tudo isso preocupa-o a principio, mas irrita-o por fim; é capaz de produzir-lhe febre á tarde, ou de augmentar-lhe a que já tinha.
Quanto ao exercico physico deve o medico sómente regral-o.
O que Sabourin aconselha é o passeio a pé.
Em realção ás medicações, Sabourin manifesta o seu modo de pensar.
Depois dos trabalhos de Bouchard e S. Bernheim o creosoto e seus congeneres passaram a ter grande voga no tratamento da tuberculose. Taes medicamentos são ainda agora diariamente prescriptos pelos clinicos de mais nomeada e em todo o mundo civilisado. No entanto Sabourin, com a sua longa pratica, mostra-se muito pouco confiante nos effeitos do creosoto e seus derivados.
É facil explicar-se o motivo de tal desconfiança. O creosoto é effectivamente um remedio que tem a propriedade de embaraçar o desenvolvimento do bacillo da tuberculose. É o que se verifica nas experiencia do laboratorio. É preciso porém que seja administrado em altas doses e estas são irritantes e mal toleradas, quer a administração seja feita por via gastrica ou em injecções hypodermicas. Dá-se o caso frequente em therapeutica de não se poder prescrever a dose proveitosa porque mais depressa prejudicaria ao doente do que entorpeceria o desenvolvimento da molestia.
Tambem é bom lembrar que todos os medicamentos de sanatorios são infensos [sic] á administração de remedios na tuberculose. O repouso, o ar puro, a alimentação e a hygiene resumem as suas quasi que exclusivas indicações.
Os anti-thermicos mesmo são prescriptos com parcimonia: – antipyrina, cryogenina, phenacetina, etc.
Em presença dos inconvenientes que pódem ter os medicamentos, diz Sabourin, pensamos que, em geral, se devem deixar os tuberculosos supportando tranquillamente a sua febre. Á tarde ella se manifesta com um ou dois graus de elevação thermometrica, mas pela manhã desapparece. Em 24 horas o doente passa pelo menos 12 horas sem febre. A cura de ar e de repouso produzem effeitos anti-febris mais seguros do que os alcançados pelos medicamentos.
Nas horas de apyrexia os doentes se alimentam convenientemente e não é raro tambem que tenham apetite ao jantar, apesar da febre vespertina. Ha doentes que jantam perfeitamente apresentando 39,º5 [sic] ou 40º de temperatura.
Sabourin acha pois que se não deve perturbar a febre dos tuberculosos, seja ella elevada ou não, de longa ou curta duração.
A febre é mesmo frequentemente um bom indicio de probabilidade de cura. O tuberculoso, diz Sabourin, que tiver lesões bem localisadas e cuja actividade fôr accusada por um acesso violento todas as tardes, comporta um prognostico favoravel nove vezes sobre dez. Elle acabará no fim de algum tempo dominando a sua febre pela cura do ar, o repouso e a alimentação (que é a consequencia das duas primeiras indicações).
O anti-thermico só encontra uma prescripção formal quando a febre surge sempre á hora do jantar e tira totalmente o appetite. E mesmo neste caso o anti-thermico deve ser ministrado quando a febre começa a elevar-se.
Como medicação accessoria Sabourin considera uteis os movimentos destinados a desenvolver a amplitude pulmonar.
Duas ou tres vezes por dia, o doente, estando sentado e tendo o relogio na mão, toma durante cinco minutos um numero determinado de inspirações (10 a 12 por minuto), regularmente espaçadas. A inspiração far-se-á de preferencia pelo nariz e o doente deve aprender a effectual-a de baixo para cima, isto é, ampliando a principio as regiões inferiores e médias do thorax, para não dilatar e elevar a parte superior do peito senão no fim da inspiração, introduzindo lenta e gradualmente nos pulmões todo o ar que puder, sem comtudo [sic] levar esse esforço ao exaggero de modo a provocar a tosse.
É uma manobra simples, pratica e proficua e que se apprende em duas ou tres lições.
Quanto aos remedios para tosse Sabourin só aconselha um – o opio.
A sua opinião é, como a de todo o medico de sanatório, que o melhor modo de combater a tosse é disciplinando-a, ou melhor suffocando-a ou afugentando-a por suggestão.
Em summa, para curar a tuberculose: ar puro, alimentação, repouso e muita hygiene.