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Texto da entrada (ID.1855)

Cometa Halley

Niza, 4. – Como em toda a parte, tambem por aqui abundam os timoratos, a quem o celebre cometa deveras tem inquietado. Justiça, porém, é dizer-se que são os ignorantes os que mais se assustam e que mesmo entre estes, a par do medo, prevalece uma certa confiança na inoffensibilidade do decantado astro, graças á propaganda que n’esse sentido fazem todas as pessoas illustradas, quando a tal assumpto se referem.

Antes do cometa aqui ser visto, havia até muitos incredulos, que por ignorancia e fanatismo, nem acreditavam na apparição do astro; mas depois que por aqui se espalhou ver-se todas as noites a uma certa hora, a incredulidade cedeu o passo a uma expectativa de panico, que os espiritos fracos não conseguem dissimular.

E se não fôra a propaganda animadora da sciencia feita nos jornaes e reproduzida elos individuos que os leem, estamos em crer que, como em algumas terras do paiz, tambem aqui teriamos de lastimar alguma triste consequencia de um medo tão absurdo.

Aos senhores parochos compete tambem, á hora da missa conventual, esclarecer o espirito dos seus parochianos, porque para muitos a voz do parocho é a que mais logra convencel-os, mas esclarecel-os por uma fórma differente por que o teem feito muitos dos seus collegas do norte que, pelo que dizem os jornaes, teem aumentado os seus reditos extorquindo missas aos miseros parochianos para applacar a furia de Deus.

Estamos certos de que os nossos parochos, que são illustrados, não commetteriam uma tal imprudencia, antes pelo contrario, cremos piamente que na primeira opportunidade contribuirão para que os espiritos mais fracos ou mais ignorantes desappareça todo o receio pela aproximação do cometa.

Como nas coisas mais serias não falta nunca a nota piccaresca e alegre, ha tambem por aqui, ao lado dos que teem medo de deixar este mundo, que não é tão mau como o pintam, aquelles que com o caso se vão divertindo e rindo, tratando de aproveitar o tempo o melhor possivel, porque tristezas não pagam dividas.

Uns, para não sentirem a tortura do cianogeneo, renderão intenso culto a Baccho; outros, como a morte é fatal em qualquer occasião e como o mal de muitos conforto é, acham grande resignação no exterminio geral; outros, como o caminho para a eternidade deve estar um pouco impedido pela agglomeração de viandantes, vão fazendo uso de callicidas, porque os callos não se fizeram para os apertões, etc., etc.

Diz-se que o commercio e as artes se teem resentido [sic] do futuro cataclysmo. Não nos parece isso muito rasoavel, porque se muitos não mandam fazer botas ou fatos, e não se alimentam melhor, muito outros ha que fazem exactamente o contrario para bem se aproveitarem dos poucos dias da existencia terrena.

Parece-nos que são os ultimos os de mais juizo.

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Pardilhó, 4. – É fóra de duvida que a visita do cometa de Halley que tem preoccupado a imaginação do nosso povo, está longe e muito longe, de corresponder ás esperanças que n’elle fundamos.

O grande dia 18 de maio, tão anciosamente [sic] esperado, offerecerá um interesse muito mediocre.

Tudo o que se tem dito a respeito do cometa é phantasia.

Tal receio deve ser posto de parte.

Podemos, pois, esperal-o tranquilamente.

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Portel, 2. – Tem sido aqui tambem muito observado o cometa de Halley, vendo-se nitidamente a sua enorme cauda, durante mais de uma hora, sendo objecto de admiração geral.

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Amiaes de Baixo, 4. – O cometa de Halley já aqui tem sido admirador [sic] por bastantes curiosos que se teem levantado ás 3 horas da manhã para o verem.

O receio que alguns espiritos menos instruidos ou mais tomoratos [sic] tinham com a apparição do bello astro, tem desapparecido um pouco com as ultimas noticias dos jornaes a esse respeito.

Ainda assim ha muitos teimosos que por mais que se lhe diga que não ha perigo algum, teimam em crêr que no dia 18 darão a alma ao Creador.

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Nazareth, 1. – Foi visto ás 3 horas e um quarto da manhã na direcção leste o tão fallado cometa Halley.

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Gouveia, 4. – O cometa Halley tem sido observado nos ultimos dias por muitas pessoas. Apresenta-se das 3 horas da manhã em deante, á vista desarmada, com bastante brilho e com a cauda do comprimento aparente, de un 5 metros. Vê-se superiormente e um pouco a norte do planeta Venus (estrella d’alva). Observado tambem com uma luneta de 170 diametros de ampliação, apresenta a cauda de uma grandeza extraordinaria e o nucleo como uma estrella de muito brilho envolvida n’uma enorme cabelleira menos luminosa, produzindo em todos viva impressão.

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Povoa de Lanhoso, 5. – Ás tres horas da manha vi o cometa de Halley subindo gradualmente até que ás 4 se tornou invisivel. Ás tres e meia appareceram no horisonte os planetas Venus e a lua, formando com elle um angulo obtuso. Outras pessoas o viram tambem.

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Monte de Caparica, 5. – Que eu saiba – e em boa hora o diga – é limitado o numero de pessoas d’este sitios que se mostram receiosas [sic] com a apparição do cometa de Halley que de nós se vem a approximar a passos agigantados.

Sei, porém, que muitos individuos estranhos á freguezia e que por aqui mourejam o pão nosso de cada dia, teem recebido cartas das familias, supplicando-lhes que sigam sem demora pare [sic] junto dos seus onde devem terminar os seus dias, visto o mundo acabar no proximo dia 18.

É assim que pensa o povo da freguezia de Taboa, onde por uma carta que ouvi ler, o abbade da freguesia traz aterrorisadas as suas innocentes ovelhas, com as prelecções que lhes vem fazendo sobre o cometa.

Mas o certo é que, varios individuos não tardam a seguir para Taboa onde irão ouvir cantar o «De Profundis» pelo abbade da freguezia quando a cauda do cometa nos levar por ares e nuvens.

Pobre povo, e mysticos abbades!

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Coimbra, 5. – Desde o primeiro d’este mez que todas as madrugadas affluem muitas pessoas aos pontos mais altos da cidade para verem o cometa.

Um dos locaes mais concorridos tem sido o Penedo da Saudade.

Ainda hoje, das 3 para as 4 horas da manhã, ali se reuniram muitas pessoas, entre ellas bastantes senhoras.


Referência bibliográfica

[n.d.] - "Cometa Halley" in Diário de Notícias de 6 de Maio de 1910, nº. 15975, p. 3 (c. 3). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=1855.



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