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Texto da entrada (ID.1861)

O cometa de Halley

Coimbra, 10 – O cometa vae despertando cada vez mais interesse.

Não perdem uns o receio de estar proximo o fim do mundo, emquanto [sic] que outros vão ganhando ensejo para irem todas as noites em alegre romaria para o Penedo da Saudade, de onde se disfructa distinctamente o famoso astro, assistindo depois ao surprehendente espectaculo do nascimento do sol por entre o fundo montanhoso que d’ali se descobre.

É um espectaculo surprehendente que a Natureza ali nos offerece, emquanto que no planalto do Penedo da Saudade, hoje transformado n’um alegre e risonho bairro com as suas largas ruas e vistosos chalets, se vêem numerosos grupos de pessoas de todas as classes, entre as quaes se destacam muitas senhoras.

Acampam por ali, uns cantando e dançando, outros comendo e bebendo, e ainda outros fazendo uso de oculos para as suas «observações astronómicas».

É uma alegria que se transmitte d’uns aos outros.

O quadro é deveras interessante, pois tem chegado ali a reunir-se mais de 400 pessoas, apesar das noites frias que tem estado.

Este espectaculo já dura desde o principio do mez e continuará ainda por alguns dias.

Aos que vão para ali não os domina o receio do cometa, mas muitos outros não chegam a tranquilisar-se emquanto não passar o dia 19 do corrente, em que o afamado astro estará mais proximo da terra.

Ainda hoje uma criada de servir entrou para uma casa com a condição de os amos a deixarem ir para a terra tres dias antes do dia 19, para «morrer» junto da familia, se porventura acabar o mundo!

Algumas lavadeiras não querem vir á cidade buscar roupa emquanto não passar o referido dia, e trabalhadores ha em localidades de concelhos proximos que não querem trabalhar sem «ver em que param as modas», como elles dizem em linguagem popular.

Sabemos que alguns parochos de localidades d’este concelho teem diligenciado fazer perder o medo aos seus parochianos, affirmando-lhes que nada ha a recear; mas pouco teem conseguido, porque ninguem lhes tira da cabeça que nos bate o perigo á porta e que está proximo o «dia de juízo»!

Ha muitas promessas feitas a Santos, que são afinal os que mais veem a ganhar com a tal historia do cometa.

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Alandroal, 9. – Por muitas pessoas tem sido observado o tão falado cometa de Halley que se vê distinctamente ás 3 e meia horas da manhã, na direcção do nascente e á esquerda de Venus, com a cauda virada para o sul. Felizmente, por aqui, o espirito popular recebe a apparição do phenomeno com bastante indifferença.

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Mourão, 9. – Tem sido observado por muitas pessoas o cometa d’Halley e, em virtude de boatos terroristas que correm, ha algumas pessoas amedrontadas, a quem temos explicado que não ha razão para sustos, fazendo-lhe notar tudo o que ácerca d’elle temos lido no Diario de Noticias.

No emtanto, algumas pessoas continuam receosas.

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Albergaria-a-Velha, 9. – O cometa de Halley tambem por aqui é assumpto quasi obrigado em todos os centros de palestra. No entanto, poua gente da villa se preoccupa com a apparição do luminoso viageiro [sic] celestial, sendo raras as pessoas que o teem lobrigado.

Em muitos povos das freguezias ruraes d’este concelho é que a perniciosa superstição, de braço dado com a analphabetismo, primordial agente da ignorancia, continua a ser o vehiculo do mais concentrado terrorismo. Varias pessoas abandonam os labores da agricultura, e outras até se absteem de praticar certos actos publicos e normaes, concernentes dos seus negocios, sem que passe o dia 19 d’este mez.

D’alguem sabemos nós que, tendo urgencia em colher os documentos indispensaveis para embarcar para o Brasil, não o faz antes d’aquelle dia, pois julga desnecessario fazer tal despeza, visto que o «nosso» valle de lagrimas vae ser mergulhado nas profundezas do ignoto pela enorme cauda d’aquelle astro errante...

«Tableau»!

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Mortemór-o-Novo, 9. – Ha dias que tem sido observado o cometa de Halley, pelo que tem havido quem tenha perdido parte da noite na curiosidade de o verem. Ha muita gente um tanto preocupada, mas muitissima que se não preoccupa [sic] com isso, e condemna o susto dos primeiros pela falta de elementos seguros que o justifiquem.

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Alfarellos, 9. – O celebre cometa de Halley tem sido visto todas as madrugadas, mas nós é que não nos incommodamos a avistal-o, porque achamos mais saboroso a caminha e o somno da manhã. O povo aqui pouco se incommoda, ou nada, a não ser alguma beata que tem medo de morrer. Na noite de 18 para 19 teremos então o gosto de avistar o illustre hospede. A philamronica [sic] projecta pata essa noite serenatas para entreter o povo.


Referência bibliográfica

[n.d.] - "O cometa de Halley" in Diário de Notícias de 11 de Maio de 1910, nº. 15980, p. 2 (c. 6). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=1861.



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