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Texto da entrada (ID.2030)

Noções de hygiene infantil

Quando a mãe não amamenta o filho, o idéal seria encontrar uma ama cujo parto tivesse coincidido com o nascimento da creança que ella vae amamentar. Deve, portanto, escolher-se uma ama cujo leite seja o mais novo possivel, pois quando o leite já tem quatro ou cinco mezes pode determinar perturbações digestivas, especialmente quando o leite é muito nutritivo e a creança de constituição fraca. A ama deve ter de 20 a 35 annos, ser sadia e ter leite em abundancia.

É geralmente preferida a mulher do campo. Ha grande vantagem, sempre que seja possivel, em observar o filho que ella tem amamentado, a fim de o examinar minuciosamente. Da existencia da syphilis na creança, resulta a suspeita de que a mãe tambem esteja infeccionada; e que, doutra fórma poderia passar despercebido, attenta a relutancia que a ama naturalmente tem em submetter-se a um exame riogoroso.

A qualidade do leite póde avaliar-se, ainda que muito incompletamente, pela sua côr azulada, cheiro e sabor agradavel; considera-se, geralmente, bom o leite que tem estes requisitos e que tinge o copo em que se deita.

Para avaliar a quantidade de caséina contida no leite, recorre-se ao lactoscopio. Ha diversos lactoscopios. Um dos que mais geralmente se emprega é o de Férer, o qual consta de um tubo de vidro, tendo no centro uma escala.

Deita-se o leite neste tubo e junta-se-lhe agua até que a escala comece a ser visivel. A quantidade de agua que se juntou ao leite indica o intervallo que havia entre os globulos antes da addicção desta, permittindo portanto, avaliar, ainda que dum modo muito incompleto, a riqueza do leite em manteiga.

O lactobulymetra de Mariaband indica-nos mais rigorosamente, a quantidade de manteiga que existe no leite; mas o processo empregado para usar d’este apparelho é mais complicado, e por isso o seu uso é menos frequente. Para verificar a proporção em que se encontra a caseina, deita-se o leite num tubo graduado e junta-se-lhe um acido, o qual, precipitando a caseina permitte determinar a quanttdade [sic] desta substancia contida numa dada porção de leite. Para verificar se o leite contem pus recorre-se ao microscopio; veem-se, então, sobrenadando num liquido, corpusculos brilhantes, redondos de diversos diametros e mais ou menos approximados entre si: são os globulos de manteiga. Quando o microscopio revela apenas a existencia d’estes corpusculos, podemos ter a certeza de que o leite não contem pus. Os globulos de pus teem os contornos irregulares e um aspecto granuloso. A presença do puz [sic] indica que existem nos seios abcessos, ás vezes, demasiadamente profundos para poderem ser revelados pela palpação. Só a analyse chimica nos póde dar rigorosamente, a proporção em que existem no leite os seus elementos constituitivos. Todavia, mesmo recorrendo a este meio, o que é certo é que, algumas vezes, o leite dado como bom, não convem á creança a quem elle é destinado.

Quando a creança não soffre perturbações digestivas, quando ella apresenta um aspecto de saude, póde concluir-se que o leite é bom. Não podendo, em geral, o recemnascido sugar, em cada amamentação todo o leite contido nos seios da ama, convém que esta, depois de apresentados os dois seios á creança, os esvasie por completo, pois a estagnação do leite pode determinar diminuição da secreção ou mesmo o seu desapparecimento.

Quando o leite diminue ou desapparece, pode recorrer-se á maçagem ou melhor á electrisação dos seios.

Benchut affirma que o melhor meio de provocar a secreção lactea é a sucção. Para verificar se a creança se desenvolve normalmente, recorre-se ás pesagens. Teem-se inventado diversas balanças para a pesagens [sic] das creanças. É indifferente o uso desta ou daquella. Deve pesar-se separadamente a roupa que a creança traz vestida e deduzir o peso desta do peso total. O peso médio do recemnascido é de tres kilogrammas.

Nos dois primeiros dias, a creança perde, approximadamente, cem grammas. Aos oito dias tem recuperado o que perdeu, de sorte que, no fim deste tempo, a creança pesa pouco mais ou menos o mesmo que pesava quando nasceu. Dahi em diante, pode considerar-se como desenvolvendo-se normalmente a creança que augmenta de 20 a 30 grammas por dia durante os tres primeiros mezes; vinte grammas approximadamente, dos tres aos seis mezes; quinze grammas, dos seis aos nove mezes e dez grammas dos nove aos doze mezes.

É impossivel, nos primeiros dias, regulamentar a alimentação da creança. Deve porém diligenciar-se estabelecer, o mais cedo possivel, horas para a amamentação. Em regra, durante os primeiros tres mezes, deve apresentar-se o seio á creança de duas em duas horas, durante o dia, e duas ou tres vezes durante a noite; dos tres aos seis mezes, de tres em tres horas de dia e duas vezes de noite.

A partir dos seis mezes, se a creança é sadia e se já tem os primeiros dentes, póde-se, de manhã substituir a amamentação por um caldo de farinha. Esta póde ser a araruta que se digere muito facilmente ou a farinha de trigo.

Quando a creança tem prisão de ventre é de grande utilidade a farinha de aveia.

Todos estes caldos se preparam com leite ao qual se junta a farinha, assucar e um pouco de sal. A farinha lactea Nestlé tambem é muito usada. A farinha maltée é preparada com uma especie de cevada a que os francezes dão o nome de «malt» e que contém assucar e uma materia albuminoide. Entra tambem na composição desta farinha a gemma d’ôvo que fornece a gordura como alimento de calorificação e que, pela grande proporção de phosphato que contém, se torna de muita utilidade, especialmente na epoca da dentição.

Todos estes caldos devem ser, a principio, administrados uma vez por dia, de preferencia de manhã, e na dose de quatro a seis colheres de sopa.

Devem ser bastante liquidos nos primeiros tempos. Mais tarde, preparam-se caldos mais consistentes e vae-se augmentando gradualmente, o numero e a quantidade das refeições, tendo sempre em vista o maior ou menor desenvolvimento da creança e as suas forças digestivas.

A alimentação da ama deve approximar-se o mais possivel da que ella usava anteriormente.

Por mais duma vez temos observado a mudança brusca de regimen dar em resultado a diminuição e mesmo a suspensão da secreção lactea.

A mulher do campo, que é, em geral a preferida, habituada a um regimen quasi exclusivamente vegetal deve adaptar-se gradualmente ao uso da carne.

O mesmo deve observar-se com relação ao vinho, sendo, em alguns casos mesmo preferivel a sua abstenção. As outras bebidas alcoolicas não devem ser permittidas.

A bebida que mais convem é a cerveja, á qual se tem mesmo attribuido a propriedade de augmentar o leite.

O chá e o café, pelas suas propriedades excitantes, só podem ser permittidos quando misturados com uma grande quantidade de leite.

É conveniente, depois de cada amamentação, lavar o mamillo com agua morna, a fim de evitar que o leite que n’elle fica, fermente e o inflamme, determinando o apparecimento de erosões e fendas. Quando estas appareçam pode applicar-se sobre o mamillo a tintura de benjoim e amido e glyceroleo de tanino, etc.

Isto basta pelo que respeita ás escoriações. Para as fendas estes meios são em geral insufficientes; o melhor é recorrer desde logo a um meio efficaz, as cauterisações com nitrato de prata, que se podem fazer sem causar dôr tendo o cuidado de applicar, um pouco antes, uma pincellagem com uma solução a 5 % de chlorhydrato de cocaina, a qual pelas suas propriedades ischemicas contribue tambem para a cura.

Não deve, porém, empregar-se a cocaina, como meio curativo, porque o seu uso continuado pode produzir a diminuição da secreção lactea. É conveniente depois lavar bem o mamillo, antes de amamentar a creança.

E. A.


Referência bibliográfica

E. A. - "Noções de hygiene infantil" in Diário de Notícias de 18 de Fevereiro de 1905, nº. 14089, p. 4 (c. 1). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=2030.



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