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Texto da entrada (ID.2128)

Chronica scientifica

A base da alimentação sino-japonica e as faculdades de trabalho dos japonezes – Resultados imprevistos – A energia dos povos do Sol Nascente nas batalhas e nos trabalhos forçados – Os colies japonezes – A pobreza da alimentação relativamente á quantidade de energia dispensada por esta casta – Comparação com o trabalhador do Ocidente – Equivalente mechanico do calor alimentar – Atributos de raça e valor das especies nutritivas – As substancias estimulantes – Os alcoolicos e os condimentos – O chá e o café na alimentação dos trabalhadores – presumida acção da Soia hispida

Uma das causas de ridiculo e desprezo da parte das gentes do Occidente para com os orientaes extremos, da China e do Japão tem sido a apparentemente debil comida popular de que estes se sustentam – o arroz –, cuja confecção a seu modo e maneira de o comer é uma das suas caracteristicas, a qual veremos que merece ser objecto de um estudo especial, no ponto de vista da economia physiologica e suas relações com os trabalhos forçados de similhantes lutadores, que hoje servem de exemplo a todo o mundo.

A miniatura da composição japoneza em presença da corpulencia agigantada do russo, junta á conhecida pobreza de uma tal alimentação que a ninguem parece sustento capaz de grandos trabalhadores, faziam presentir [sic], ao embate das duas nações, um descalabro horrivel do lado dos soldados do mikado.

Apreciava-se sobretudo que um povo mal alimentado seria incapaz de um esforço aspero e prolongado; a recente batalha de Mukden, na qual durante dez dias, sem descanço [sic], por entre tempestades de neve, os japonezes se atiraram contra os russos, até os derrotar, assim como em outros actos não menos espantosos da guerra, vieram mostrar que o verdadeiro perigo amarello está para os russos nessa raça niponica, dispondo de uma singular resistencia a toda a prova.

Não é somente nas batalhas que esta raça revela a sua força; é tambem no labutar do operario.

Efectivamente a comida dos japonezes, em comparação com a dos europeus e norte americanos é realmente muito inferior.

Observações bem feitas provam entretanto que o trabalhador japonez é superior ao seu equivalente ocidental. Saber por que razão physiologica se consegue um rendimento mechanico maior com um combustivel evidentemente pobre é um problema scientifico, cuja solução ilucidará uma quantidade de questões economico-sociaes de interesse. É o que pretende um physiologico distinto, dr. Weisgezber, o qual numa recente viagem ao oriente teve occasião de estudar o assumpto com uma attenção minuciosa de verdadeiro homem do saber.

No esclarecido entender deste observador o colie japonez está para a producção do trabalho nos portos do archipelago niponico como o camelo para os carregamentos e transportes do deserto.

Fornece um esforço consideravel e demorado, contentando-se com a mais parca alimentação, em rações distanciadas.

Em 25 horas de tarefa não interrompida, 250 colies transferem e arrumam 2:000 toneladas de carvão.

Nesse periodo passam pela mão de cada colie 250:000 kilos, que elle tem de elevar á altura de um metro para os fazer entrar num navio, o que dá uma avaliação de mais de 200:000 kilogrametros de trabalho utilisavel, fora os atritos, os movimentos indispensaveis do corpo, a transformação respiratoria, etc. Ora o professor A. Gautier, da Faculdade de Medicina de Paris, avalia em 75 a 80 mil kilogrametros o trabalho de um operario em dez horas, continuado e sem nada de excesso. Em comparação, pois o colie japonez rende mechanicamente cerca do triplo do que pode fazer qualquer dos nossos trabalhadores, se considerarmos que o serviço util se acrescenta o movimento do corpo, a respiração, o vencimento dos attritos, o que ele [imagem] va a 500:000 kilogrametros o esforço real durante o dia operario.

É para admirar que estes servidores, homens, mulheres e creanças, só dão pela maior parte signaes de fadiga no fim da sua jornada, permittindo-lhes aquella ainda rir e cantar, o que significa restar-lhes uma reserva de energia sufficiente. Podem além disso voltar ao labor, apos um curto descanço.

Estes factos, que representam uma actividade prodigiosa, dificilmente se explicam pela quantidade e valor das substancias ingeridas, em que o arroz entra pela maior quantidade, mais um pouco de peixe e alguns condimentos, de que o mais importante é o choyu, especie de molho rico em principios azotados, resultante da fermentação da semente de Soia. Como bebida usam de preferencia o chá fraco ou o saké, liquido alcoolico extrahido do arroz. Sabendo-se que de todas estas especies elles se contentam de pequenas porções, repartidas em tres refeições diarias, ha toda a razão de admirar a resistencia desta casta, que ainda á sua necessidade principal subtrahe um tanto para a Cruz Vermelha e outras obras patrioticas!

Não parece que a ração alimentar dos carregadores Moji, onde a faina do carvão atinge o seu maximo, corresponda aos numeros physiologicos das proporções de alhuminoides e hydratos de carbone, necessarias ao operario europeu submetido a um trabalho fatigante. O arroz é o cereal menos rico em materias gordas e azotadas e quanto aos outros alimentos, são consumidos em tão diminuta fracção que não se pode contar com qualquer compensação da parte delles.

Ha motivo para julgar que na comida do trabalhador do Sol Nascente não ha equivalencia ao pão, azeite, queijo e legumes do operario do Ocidente.

Para que o organismo seja capaz de um determinado dispendio de força é indispensavel fornecer-lhe um alimento transformavel em calor. Assim, para obter do productor no nosso clima o trabalho util, durante uma dezena de horas cada dia, são precisas 4:200 calorias que lhe proveem da combustão dos principios alimentares acima indicados.

Para um esforço de 280:000 kiligramas gasta 659 calorias, isto é, 15,7 por cento das calorias alimentares totaes. O resto é consumido nas perdas pela respiração, evaporação cutanea, etc.

O colie japonez está longe de dispor de 4:200 calorias e contudo executa obras cuja avaliação kilogrametrica é pelo menos egual á do trabalhador europeu.

A dieta oriental caracterisa-se portanto por um excesso de vegetarianismo que a empobrece pelo lado do azote.

As carnes, a não ser uma pequena porção de peixe, são excluidas.

A actividade do povo niponico explica-se em parte por um poder de assimilação muito grande, que pode ser uma atributo ethnico.

Existem além dos alhuminoides, outras especies nutrientes que favorecem ou estimulam a contracção muscular e permittem a transformação mechanica de um maior numero de calorias.

Esta é a funcção das substancias chamadas nervinas, as quaes por uma acção directa sobre o sistema muscular ou indirectamente pela excitação do nervo obrigam a produzir um exercicio mais prolongado, sem fadiga notavel.

Taes são as bebidas espirituosas e os condimentos.

O chá e o café estão neste caso, mesmo para os povos do poente. Muita da nossa gente das oficinas e no serviço domestico consegue muitas horas de labor sustentada de café, muitas vezes desacompanhado de pão.

É certo que a cafeina como a theina, principios activos do café e do chá, são tonicos musculares e nervinos bastantes poderosos e neste caso muitos superiores aos alcoolicos, por isso que pela sua combinação azotada favorecem a transformação energetica no organismo e promovem por isso o sustentaculo demorado, que dá uma actividade bastante na maioria dos casos.

Para os colies não é atribuivel ao alcool o excesso de potencia musculo-nervosa, pois que o saké, a aguardente mais usado no Japão, não lhes chega em dose forte e repetida para ter uma influencia decisiva na vida laboriosa desta multidão efervecente.

O segredo dessa particular resistencia julga o dr. Weisgerber encontral-o no uso de certos condimentos, cuja composição não é por emquanto [sic] conhecida, mas que encerram talvez os agentes incitantes e de armazenamento de força capazes de entreter as faculdades pouco vulgares de trabalho que distinguem desde longa data a população niponica.

O producto estrahido do Soia hispida está neste caso.

A soia é uma planta leguminosa das regiões quentes da Asia, vulgarmente conhecida pela denominação de ervilha chineza, cuja semente contem bastante substancia alhuminoide e materias gordas, em que consiste a sua riqueza alimentar.

Sem duvida o estudo deste auctor é o incentivo para obra de mais largo folgo a favor do desenvolvimento physico e economico dos povos, tendo por fundamento a alimentação.

BETTENCOURT FERREIRA.


Referência bibliográfica

J. Bettencourt Ferreira - "Chronica scientifica / A base da alimentação sino-japonica e as faculdades de trabalho dos japonezes – Resultados imprevistos – A energia dos povos do Sol Nascente nas batalhas e nos trabalhos forçados – Os colies japonezes – A pobreza da alimentação relativamente á quantidade de energia dispensada por esta casta – Comparação com o trabalhador do Ocidente – Equivalente mechanico do calor alimentar – Atributos de raça e valor das especies nutritivas – As substancias estimulantes – Os alcoolicos e os condimentos – O chá e o café na alimentação dos trabalhadores – presumida acção da Soia hispida" in Diário de Notícias de 4 de Julho de 1905, nº. 14223, p. 1 (c. 5-6). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=2128.



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