Academia de Estudos Livres
Lições de Quimica
Perante numeroso publico, que enchia o anfiteatro da aula de Quimica da Faculdade de Sciencias, realizou o sr. Achiles Machado a 4.ª lição publica do curso de Quimica.
O prelector ocupou-se dos alimentos em que predominam as substancias gordas. As gorduras entram em quase todos os alimentos. Para compreender o que é uma gordura é preciso saber o que é um acido. Um acido é um composto em que entra sempre hidrogenio. Deitando um acido sobre um metal, o hidrogenio do acido liberta-se, sendo substituido pelo metal: fórma-se o que se chama um sal. O acido tem a propriedade de avermelhar a tintura de tornesol. Os quimicos conhecem centenas de acidos. Nas gorduras entram sempre três acidos: acido palmitico, acido estearico, acido oleico. Na manteira ha mais o acido butirico. Assente a noção de acido, temos agora de compreender o que é uma base. Genericamente podemos dizer que é uma substancia antagonica do acido. Deitando o sodio na agua, aquele apodera-se do oxigenio e liberta o hidrogenio. Em vez da agua ficam três elementos livres: oxigenio, hidrogenio e sodio, que neste caso se chama soda caustica. Esta é uma base, que restitue a côr azul á tintura de tornesol avermelhada por um acido. Ha acidos e sais gazozos; o acido cloridrico e o amoniaco, por exemplo. Experiencias classicas demonstram a sua existencia em balões fechados, aplicando-se a sua reconhecida acção sobre reagentes como a tintura de tornesol e outros. Resumindo numa fórmula a acção dum acido sobre uma base podemos dizer que
Acido + base = sal + agua, isto é: forma-se sempre um sal e agua
Uma gordura pode considerar-se uma mistura de sais. Já di[s]semos quais eram os principais acidos da gordura. A base é a glicerina, uma substancia que todos conhecem perfeitamente. Assim, podemos reduzir a formulas faceis de comrpeender as acções dos acidos das gorduras sobre a base-glicerina:
acido palmitico + glicerina = palmitina + agua
acido stearico + glicerina = stearina + agua
acido oleico + glicerina = oleina + agua
De todas as gorduras podemos tirar glicerina, tratando-as por uma base, o sodio ou o potassio por exemplo. Obteremos assim sais: palmitato de sodio, stearato de sodio ou oleiato de sodio ou de potassio. Estes sais são os sabões que todos conhecem tambem. Com os acidos estearico e palmitico obtemos igualmente um produto industrial, muito conhecido: as velas de estearina. Produzem-se isolando aqueles acidos da glicerina. As antigas velas de cebo, além de darem má luz, eram mal cheirosas, porque se queimava tambem a glicerina.
Vamos agora tratar das gorduras sob o ponto de vista alimentar. As gorduras são dos três tipos de alimentos os mais ricos em carbone. Produzem por isso muito mais calor. Não se prestam muito para nos dar a energia, porque servem principalmente, repetimos, para nos dar o calor necessario á vida. Assim, 100 gramas de gordura produzem um certo calor C. Para produzir o mesmo calor são precisos 234 gramas de assucar ou 324 gramas de substancias proteicas.
Quando o animal é muito novo precisa de mais calor. Dá-se isto tambem no genero humano.
Uma criança de mama precisa de: Substancias proteicas, 19 partes; gorduras, 53 partes; hidratos de carbone, 28 partes.
Uma criança desmamada (2 anos): Substancias proteicas, 17 partes; gorduras, 32 partes; hidratos de carbone, 51 partes.
Um operario (adulto): Substancias proteicas, 17 partes; gorduras, 16 partes; hidratos de carbone, 67 partes.
O clina e o meio geografico teem tambem muita influencia sobre os organismos, determinando nas suas gorduras proporções variaveis.
Examinando os leites de diversos animais, vivendo em latitudes diversas e em meios diferentes, temos referindo o quantitativo ao litro:
Leite de vaca – 35 gramas de maneita (gordura); leite de rena 171 gramas de manteiga; leite de golfinho, 438 gramas.
Vê-se, portanto, que quanto mais frio é o clima, ou o meio[,] de mais gorduras precisa o animal.
Outra questão importante é a da fusibilidade das gorduras[,] fusibilidade que varia conforme a profundidade em que se encontra a gordura no organismo.
As gorduras sofrem, quando ingeridas, a acção da bilis e do suco pancreatico nos intestinos. Transformam-se ali em sabões, soluveis portanto no sangue. Levados para este recompõem-se outra vez em gorduras, queimam-se para produzirem o calor, depositando-se o excesso, que não foi queimado, no chamado tecido adiposo.
Os animais podem encorporar em si gorduras de outros animais.
Não está provado que as substancias proteicas se transformem em gorduras; mas estas podem resultar dos hidrocarbonatos.
Os tipos principais de gorduras alimentares são: o azeite, a manteiga, a banha de porco.
O prelector, depois de caracterizar as principais propriedades destes produtos, passa a tratar das suas falsificações,
A principal falsificação do azeite consiste em substitui-lo por outros oleos mais baratos, oleo de amendoim por exempo, Esta falsificação descobre-se facilmente se o paladar não estiver embotado.
Uma das falsificações mais vulgares da manteiga é deixá-la com muita agua para pesar mais. É claro que esta fraude da manteiga é da inteira responsabilidade do produtor e não do comerciante. Outra falsificação é substituir a manteiga pela margarina, uma gordura que se extráe do cebo. Sendo este produto de animais sadios, não ha perigo para a saude. O mesmo não acontece quando o cebo é de animais doentes, de carbunculo, de morbo, etc. Então estas doenças podem transmitir-se ao homem. Outra falsificação é juntar uma substancia para dar côr á manteiga. Não haverá inconveniente, se a substancia corante fôr quimicamente inofensiva. Outra falsificação, para dar mais peso á manteiga, é juntar-lhe amido, batata e até gesso!
O que se passa com a manteiga dá-se com a banha, acontecendo muitas vezes que não é de porco mas de outro animal...
A 4.ª lição realiza-se no domingo proximo.