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Texto da entrada (ID.2262)

Academia de Estudos Livres

Lições de quimica

Realizou ante-ontem o professor Aquiles Machado a 6.ª [sic] lição de quimica, no anfiteatro da Escola Politecnica. Numerosissimo publico enchia o vasto anfiteatro.

O tema da lição foi os assucares e alimentos estimulantes. Ha hoje conhecidas dezenas de assucares. Quimicamente são todos hidratos de carbone, contendo, portanto, os tres elementos: hidrogenio, oxigenio e carbone.

Vamos estudar os que mais interessam á alimentação. O assucar ordinario, que todos conhecem, a sacarose, extrai-se da cana de assucar. Desde o ano de 1400 sabe-se preparar o assucar isolado. Anteriormente usava-se o mel e outras substancias doces. Cerca de 1750 descobriu-se tambem o assucar de beterraba. Para extrair o assucar da cana ou da beterraba, usam-se dois processos: extrai-se expremendo [sic] a planta; extrai-se cortando a cana ou a beterraba em tiras e metendo-as em agua. Para isolar o assucar da agua, faz-se evaporar esta em aparelhos proprios, chamados de «cozer no vacuo». O assucar é alvo de inumeras falsificações. Umas vezes, para pesar mais, juntam-lhe amido, dextrina, cré ou gesso. Outras vezes, adicionam-lhe assucar de inferior qualidade.

O assucar ordinario pode transformar-se em glicose, o assucar dos diabeticos e das uvas. Para tal, basta trata-lo por um acido diluido. Ingerido, o assucar transforma-se em glicose e frutose a esta mistura chama-se assucar invertido. Só assim é que é assimilado e vai para o figado onde se transforma em glicogenio. O assucar dá alcool e anidrido carbonico. Quando se produz este desdobramento, obtem-se da cana de assucar a bebida que todos conhecem: aguardente de cana.

Outro assucar que nos interessa é a glicose, que, como já se disse, existe nas uvas e na urina dos diabeticos. A glicose não adoça tanto, porque não cristalisa facilmente. Por isso é que se emprega em certos produtos de confeitaria, como os bombons.

Todos os hidratos de carbone, celulose, amido, batata, etc., podem transformar-se em glicose, pela acção dum acido diluido. E como da glicose se obtem alcool, facil é extrai-lo dos mais variados produtos, papel, algodão, etc., etc.

Mostra-se depois, adicionando-lhe o chamado licor de Fehling, tão usado na pesquisa do assucar dos diabeticos, que a reacção da glicose é caracteristica: obtem-se um liquido cor de tijolo (empregado para colorir de vermelho tijolo).

A lactose (assucar do leite) como a maltose (assucar de cerveja) tem a mesma composição da sacarose. Produzem o mesmo calor: 100 gramas dão 395 calorias. A glicose tem menos rendimento, produzindo apenas, para a mesma quantidade, 374 calorias.

O prelector passa em seguida a ocupar-se das bebidas estimulantes. Dantes chamavam-lhes alimentos economisadores, porque se supunha que o seu uso economisava o de outros alimentos, produzindo a mesma energia. Ora isto não é verdadeiro, porque não pode haver trabalho sem consumo. A bebida estimulante não dispensa os outros alimentos; o que produz, por uma acção nervosa, é fazer desaparecer a sensação da fome. Este efeito nota-se tambem em outras circunstancias: quando um homem, sem forças por mingua de alimento, come, logo depois de comer, quando o alimento ainda não foi digerido, começa a trabalhar … Este caso é tambem devido a uma acção nervosa.

No café encontra-se um alcaloide – a cafeina – cuja acção sobre o organismo é poderosa. É o mesmo alcaloide que se encontra no chá, e a que se dá então o nome particular de teina. A cafeina tem acção principalmente sobre o coração.

As falsificações do café são inumeras: misturam-se-lhe grãos de outras plantas, grãos de café avariado e fermentado. Ha muita gente que julga o café um grão insusceptivel de fraude. Puro engano: fazem-se grãos fingidos de café, com o barro! Outra falsificação: fazer absorver agua ao café: vende-se assim agua por café… Com o café moido as falsificações ainda são muito mais numerosas. Alfarroba, figo, trigo, cevada, milho e muitas outras substancias, tudo isto torrado e moido, vende-se como bom café!

Uma das falsificações mais vulgares, além do pão torrado e do pó de café, é a da chicoria. Os falsificadores chegaram já a empregar a turfa…

Fala em seguida, do chá e suas falsificações.

O sr. Aquiles Machado ocupa-se depois do chocolate e cacau. O cacau é mais alimentar em virtude de possuir um alimento gordo – a manteiga de cacau. O chocolate deve ter cacau, baunilha e assucar. São tambem inumeras as falsificações deste produto, como demonstra o prelector.

Proseguindo [sic], o sr. Aquiles Machado ocupa-se da cerveja e do vinho, demorando-se no estudo das qualidades alimentares destes produtos, qualidades provenientes do alcool que conteem. O alcool é realmente um alimento? Ingerido em pequena quantidade dá o calor, o que é necessario ao organismo. Tomado em demasia, revela uma acção toxica, prejudicialisssima ao organismo. O homem embriagado tem todos os sintomas do envenenamento; os vomitos, as extremidades frias, etc., etc. Mostra como é nociva a pratica de «matar o bicho». Ingerir alcool em jejum, e alcool que muitas vezes provém de origem pouco recomendavel, é produzir doenças graves, que tantas vezes, quando o vicio é secreto, escapa ás pesquizas medicas e arrasta o individuo á loucura e á morte.

Depois de se referir á pratica nociva de lavar as garrafas para vinho com chumbo em grão, o que pode dar lugar a graves intoxicações, fala das falsificações de que é objecto o vinho.

Incidentalmente refere-se tambem á intoxicação pelo chumbo, das pessoas que usam tomar rapé. Como se sabe, este produto encontra-se no mercado em pacotes forrados daquele metal.

Como se pode fazer ideia, a lição foi interessantissima e cheia de ensinamentos preciosos, para quem deseja saber. Assim o compreendeu o publico, que no final aplaudiu calorosamente o sabio professor.

No proximo domingo realiza-se a 6.ª e ultima lição deste ano, sendo o tema «As carnes».


Referência bibliográfica

[n.d.] - "Academia de Estudos Livres / Lições de quimica" in Diário de Notícias de 1 de Junho de 1915, nº. 17802, p. 4 (c. 1). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=2262.



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