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Texto da entrada (ID.2306)

O problema industrial

A brilhante conferencia do sr. Aboim Inglês é premiada com os mais calorosos e estusiasticos aplausos

É preciso amparar, ampliar e desenvolver a nossa industria para o equilibrio da vida nacional.

A nossa salvação ainda pode remediar-se se todos praticarmos os três Evangelhos: Trabalhar! Economizar! Produzir!

O tema da conferencia de ontem, confiada ao ilustre presidente da Associação Industrial e distinto engenheiro, sr. Aboim Inglês, versava um dos assuntos de maior importancia para o desenvolvimento e prosperidade da nossa terra.

E em boa hora foi entregue a sua explanação á alta competencia do sr. Aboim Inglês que, a par de uma forma elevada e erudita, soube pôr nas suas palavras uma bonhomia, uma franqueza e um cunho de sinceridade tal, que transformaram a natural aridez do assunto numa das mais atraentes palestras que nos tem sido dado escutar.

Nas três partes em que o orador dividiu a sua notavel oração soube ele, com rara felicidade, interessar os especialistas no assunto, pelos novos aspectos que conseguiu descobrir para a explanação e soluções do problema, os verdadeiros patriotas, pelo calor e entusiasmo com que incitou todos os bons portugueses a um trabalho consciente e continuo para salvação da Patria, e as pessoas cultas e inteligentes, emfim, que no final de uma interessantissima conferencia, em que principalmente se apresentavam numeros, estatisticas e notas de recursos e de possibilidades, pôde aplaudir – e calorosamente o fez! – uma notabilissima oração em que nem um só minuto a mais leve sombra de tedio invadiu os assistentes.

Dissemos ha dias que bastava ler o sumario da conferencia para de antemão se anunciar o brilho e o interesse do trabalho do ilustre presidente da Associação Industrial. Pelo rapido e palido resumo que hoje dela damos, verão os nossos leitores que a prelação do conferente de ontem constitue, não apenas uma obra literaria de valor, dita com a mais encantadora simplicidade, mas ainda e principalmente uma proveitosa lição, entre outras coisas, da forma de aproveitar as riquezas naturais, muitas das quais podem substituir com vantagem ou em igualdade de circunstancias os produtos estrangeiros.

Pouco depois das 21 horas, estando a sala repleta de senhoras e de figuras da mais elevada cotação no meio industrial, comercial, politico, financeiro e literario; vendo-se tambem muitos estudantes, tomou a presidencia o sr dr. José Joaquim da Silva Amado, ilustre presidente da Academia secretariado pelos srs. Manuel Carlos de Freitas Alzina, em dos nosso mais distintos industriais, e pelo nosso presado director, sr. dr. Augusto e Castro.

Este ultimo, tomando a palavra, fez em breves e caloroso termos o elogio do conferente, referindo-se com o mais justo louvor aos seus notaveis trabalhos e aos seus vastos conhecimentos, que o elevaram, por direito de conquista, ao honroso cargo de presidente da Associação Industrial, ilustrando o seu nome que todos respeitam, admiram e estimam.

A conferencia

1.º O que é actualmente a industria portuguesa

2.º Possibilidades de obter força motriz barata

O que póde e deve ser a industria portuguesa.

Levanta-se então o sr. Aboim Inglês. As suas primeiras palavras são de agradecimento ao Diario de Noticias pelo convite que lhe dirigiu para realizar a conferencia, e de exortação ás senhoras presentes para que eduquem os seus filhos nos sãos principios, fazendo deles bons e honestos portugueses. E, depois de aludir á complexidade da crise nacional e ao estado precario da nossa situação financeira, o orador, que desde principio cativa a atenção do auditorio, aborda o problema industrial, dividindo em três capitulos o estudo que vai apresentar: 1.º «O que é actualmente a industria portuguesa; 2.º Possibilidades de obter força motriz barata; O que póde e deve ser a industria portuguesa.»

A industria nacional vegeta e está na contingencia de desaparecer

Dentro do ambito que traçou para esse primeiro capitulo, o sr. Aboim Inglês contesta que Portugal seja – como é habito dizer-se – um pais agricola, e não industrial, pois considera a agricultura uma industria e aquela em que mais esperanças deposita. Por variadas razões que explica, afirma que chegamos á actualidade com mais tendencias comerciais do que industriais, faltando-nos aquela inclinação para o esforço continuo e metodico, que a industria reclama, e, por isso, julga que, entre nós, a industria foi criada pelo comercio.

A guerra veio dar-nos a lição de que todos os povos devem produzir, pelo menos, de produtos que consumam, dentro das possibilidades que os seus recursos de materias primas, de territorios, de clima, de população e de capital, permitam. Dentro dessas possibilidades muito produzimos já, mas muitissimo mais é indispensavel produzir.

Após ter afirmado que temos fabricas e fabricantes e honrariam qualquer pais e que são ignorados pela maioria dos portugueses, o orador fez a larga enumeração de artigos que produzirmos, para, seguidamente observar, com desgosto, que, apesar disso, de quase tudo ainda importamos porque a industria ainda não representa na vida nacional o elemento de criação de riqueza e de progresso que é preciso que ela represente, aproveitando os valioso recursos que possuimos. O caminho a seguir é importar as materias primas e exportar os produtos fabricados.

Existe hoje em Portugal uma uniforme necessidade de amparo e assistencia á Industria que só os poderes publicos podem dar.

Julga-se que a industria em Portugal ganha rios de dinheiro: puro engano! No principio da guerra, houve grandes ganhos aparentes, que eram a liquidação dos «stocks» de materias primas e que enriqueceram alguns industriais; depois só teem enriquecido os industriais que, ao mesmo tempo que fabricam, podem especular com o seu produto fabricado.

Hoje, com o custo da força motriz, das materias primas e da mão de obra a industria nacional vegeta na contingencia de desaparecer se o Estado não tiver a coragem de gastar uma grande parte dos recursos que possa obter em determinadas obras de fomento em concorrencia com o estrangeiro.

Os industriais teem tambem que modificar os seus processos e metodos de trabalho para se poderem impôr ao respeito dos governantes.

O grandioso plano de fornecimento de energia eléctrica

O segundo capitulo do brilhante estudo do sr. Aboim Inglês tem redobrada importancia. A força motriz custa hoje em Portugal mais do quadruplo do que deve custar, ainda com tendencia para subir – assegura o ilustre conferente. Em breve, as industrias terão de para por não termos ouro para comprar combustiveis; ou os produtos fabricados tomarão tal preço que mereça mais a pena importa-los do que fabricá-los. Com o preço de 120 escudos por tonelada de carvão inglês e os salarios como estão, já custa «um cavalo vapor ano» mais de 1.000 escudos! /Se se empregar electricidade da companhia, ainda custa mais.

Para que a industria prospere torna-se indispensavel arranjar imediatamente força motriz barata, como questão previa. Será possivel arranja-la? Creio que sim.

Carvão: Temos de encarar o problema sob dois aspectos: a necessaria melhoria imediata e a resolução futura.

«Para melhoria imediata», sabe o orador que s ex.ª o ministro do comercio está nos melhores desejos de fazer tudo quanto possa para a conseguir compra directa ao produtor; transporte directo em navios do Estado por frete razoavel, e distribuição ao consumidor por intermedio das Associações Industrias parece-me que seria o mais eficaz remedio a dar neste momento á exploração que por ao se faz com o carvão estrangeiro.

Não devemos tambem esquecer – acrescenta – que temos combustiveis nacionais aproveitaveis, que não devem ser sistematicamente postos de parte. Na sua maioria são aproveitaveis, com mais trabalho para os fogueiros, e menos efeito util, mas sempre com proveito para a economia nacional. Eu sei por experiencias proprias que cada tonelada de carvão nacional empregado convenientemente dá o efeito de 500 kilogramas de carvão inglês. A industria deve, pois, empregar a maior percentagem possivel de carvão nacional.

Considerando, especialmente, a impossibilidade de se obter o ouro necessario para o pagamento do carvão na quantidade que importavamos antes da guerra, o orador diz que para acudir a esta triste e aflitiva situação crê que é economisando quanto possivel os combustiveis importados e obrigar a uma lavra maxima todas as minas de carvão do continente.

Exploração das minas de carvão deve obedecer a um plano do conjunto em que todas as minas entrem com o que possam produzir em maxima intensidade para que possamos reudzir ao minimo o nosso «deficit». Esses carvões devem ser queimados em grandes centrais electricas nas zonas mineiras e em vez de transportarmos o combustivel transportaremos a força electrica.

Deve o Estado mandar imediatamente estudar as minas de carvão existentes e os seus planos de lavra em conjunto de maneira, que, nas minas da região do Douro, possam obter-se 700:000 toneladas anuais e nas da região do Juracico possam obter-se 1.000.000 de toneladas, as necessarias para nos pormos ao abrigo da importação.

Ao mesmo tempo deve o estado mandar projectar as instalações para produzir a electricidade com esses carvões e para distribui-la pelos centros industriais. Crê que três grandes centrais se devem estudar: uma no Douro para fornecer força electrica até Lisboa.

Sabe que estes carvões precisam caldeiras especiais para se queimarem; mas por experiencias proprias pode garantir que todos eles são capazes de produzir vapor, dependendo o seu bom aproveitamento do tipo de caldeira que se empregue.

Mas, ainda mais: com o sistema de reduzir o carvão a pó impalpavel e de o queimar em jacto de ar sob pressão que actualmente se usa, ha já a garantia do total aproveitamento dos nossos carvões o que viria ainda facilitar a questão.

O distinto conferente já tinha visto também queimar, num pequeno aparelho Holbeck, «lenhites» em pó, que não são melhores que as nossas, e que ardiam com combustão completa. Este processo pode empregar-se aos carvões secos do Douro e ás «lenhites» que não sejam distilaveis da zona de Leiria; porque ás distilaveis que tem gazogenos especiais dão gaz e sub-produtos, outro tratamento para o seu completo aproveitamento se terá de empregar para obter pela distilação os oleos e o sulfato de amonia, tão preciso para a agricultura.

Entretanto, se fazem esses estudos e os projectos das ligações das minas com as centrais, deve o Estado estudar a forma em que as varias emprezas mineiras devem entrar nesta exploração em conjunto.

Se as emprezas quiserem por si só fazer este grande empreendimento, obrigando-se a fornecer electricidade precisa as varios centros industriais ao preço maximo de 80 reis o kilovatio hora; entende que devem dar-se a essas empresas todas as facilidades, todas, inclusive isenção de contribuições, de direitos de alfandega para as maquinas, etc., exigindo-se-lhe, porém, que a empresa seja portuguesa, que as instalações estejam totalmente prontas e fornecendo já electricidade em 3 anos e finalmente, que o preço maximo seja de 8 centavos por KV hora.

Se, porém, as empresas mineiras, não puderem ou não quizerem combinar-se para a execução de tão patriotico empreendimento; tão seguro está do exito e suprema necessidade desta grande obra de fomento, que entende que o Estado não deve vacilar em fazer por empreitada as obras que façam parte dos projectos.

Calcula o sr. Aboim Inglês que com 50.000 contos se executa este grande empreendimento, e que se poderá vender a electricidade ao preço maximo de 8 centavos o kilovatio hora, tendo em conta o juro do capital e uma amortização de 10% e que, não perdendo tempo, em 3 anos podem as obras estar concluidas.

Existem em Portugal mais duas zonas carboniferas: «A do Moinho da Ordem», no Alentejo, que foi entregue sem concurso a um particular pelo governo do sr. Sidonio Pais, sob determinadas condições; e «A do Luso», onde jazigo algum de importancia se tem encontrado nas pesquizas particulares que ali se teem feito.

Julga, pois, que, com os carvões nacionais nós melhorariamos muito a questão da força motriz para as necessidades mais urgentes.

Em seis anos podemos utilizar a energia das nossas quedas de agua

Uma das partes mais curiosas do importantissimo e reflectido estudo que o que o ouve no meio de religioso silencio e da mais aguçada atenção, é a que se refere as quedas de agua, para onde ultimamente se teem voltado tantas esperanças.

Em torno das quedas de agua eu tenho visto escrito e ouvido tanto discurso, – declara o orador – que algumas vezes chegado a imaginar que tudo podai ser verdade... Afinal, o que ha de positivo sobre quedas de agua? Pouco, mesmo, infelizmente, muito pouco!

Não sou pessimista, mas não quero ser tambem optimista. Em torno das quedas d’agua teem-se formado grupos exploradores, ha mesmo quem viva disso ha muito tempo; teem-se feito negocios que constam de escrituras publicas, pretende-se formar companhias, sociedades; enfim incuria e desleixo em que temos vivido. O portugues só sabe viver aos empurrões ou 8 ou 80.

Tivemos o carvão barato e uma vida desafogada, podiamos ter estudado as quedas d’agua e até ter executado as que merecessem. Não se fez. Sobre o preço do carvão e, então, toda a gente quer quedas d’agua, fabricam-se, inventam-se, pedem-se contratam-se, vendem-se quando ha quem compre; mas em geral, não se conhecem, nem estão estudadas!

Á parte meia duzia de quedas de agua que bem podiamos chamar «as classificadas», que existem estudadas e executadas ou em execução, o resto, por ora, só existe no papel.

Como é natural, em trono do desconhecido, inventam-se lendas e assim as quedas de agua em Portugal, inclusive as do Douro, teem crescido tanto na fantasia publica que já estão em muitas centenas de milhares de cavalos, sem que esteja, sequer estudadas!

Sabe o orador que realmente existem algumas quedas de agua aproveitaveis no norte de Portugal; mas julga que não teem importancia que ultimamente se lhe tem atribuido. Sem duvida as mais importantes são as do Douro internacional, em volta das quais tantos discursos e tantos escritos se tem produzido. Acerca delas aplica-lhes aquele ditado espanhol que diz «La riqueza y la santidade s la mitad de la mitad» e ainda assim, calculando-se por ai em 500;000 HP, se ficássemos com 80 ou 100; 000 HP bem mereciam todos os nossos trabalhos.

É necessario que, imediatamente e com bastante pessoal, se façam os estudos dos nossos rios e se reconhecer o verdadeiro valor das quedas de agua que possamos obter, projectando as obras necessarias. O ilustre conferente é de parecer, dadas as circunstancias especiais da vida portuguesa, que o Estado não deve conceder as quedas de agua de potencia superior a 400 KV, as quais devem constituir propriedade do Estado.

Depois de devidamente e com maxima rapidez se terminarem os respectivos projectos, devem ser construidos, por empreitada, mas por conta do Estado, sob a vigilancia de juntas autonomas que devem constituir-se para esse fim.

Por intermedio dessas juntas se deve vender a energia electrica por tão baixo preço que apenas pague as despesas de exploração, juro e amortização das obras e instalações. O ganho para o Estado virá das receitas indirectas que a riqueza criada pela força hidro-electrica barata ha-de fatalmente produzir.

Havendo estabilidade e equidade nas tarifas o exito será seguro.

Se o estudo e construção das «quedas de agua» não fôr feito pelo Estado, as demandas e chicanas entre os varios grupos de pretendentes continuarão eternamente, e com as suas influencias serios desgostos nos podem vir a causar.

Sendo o estudo das quedas feito pelo Estado, mais facil será impor as necessarias expropriações e nunca se correrá o risco da desnacionalização deste elemento de riqueza publica.

As pequenas quedas d’agua até 400 KV entende o brilhante orador que devem ser concedidas a quem legalmente as tenha pedido e de preferencia a que as pretenda usar, porque não é moral o que sucede geralmente; «isto é», quem pede uma «queda d’agua» rarissimas vezes é quem a usa; é qualquer «chasseur d’affaires» que a vai vender, já cara, fazendo assim aumentar o preço da instalação e portanto o da força hidro-electrica venha a ter desde já, uma acção rapida sobre a melhoria da nossa crise. Estudos, projectos e execução de obras e instalações desta natureza, que só em determinadas epocas do ano podem fazer-se, são sempre morosas e entrando questões internacionais ainda mais.

De maneira que em menos de 5 ou 6 anos não poderemos nós vir a ter em função as forças hidro-electricas importantes que os estudos nos mostram haver em Portugal.

Concretizando: em 3 anos podemos ter a utilização de carvões nacionais diminuindo dois terços a importação de combustivel estrangeiro. Só na diferença das cambiais que deixariamos de comprar, se amortizava o capital deste empreendimento.

Em 6 anos podemos ter as quedas d’agua que haja em Portugaltambem funcionando. Não se atreve a calcular o numero de KV que poderemos obter. O ilustre engenheiro o sr. Ezequiel de Campos calculou em 50.000 «cavalos vapor» a força hidraulica economicamente utilisavel no Norte de Portugal (A conservação da Riqueza Nacional pag. 472). Este calculo é de 1913, as condições economicas variariam, o preço do combustivel é hoje 20 vezes o que era então, o que nos autorizava a aumentar este numero; mas não o faremos.

Se em 5 anos tivermos em função, já teremos trabalhado mais que muitas gerações passadas e bem redimido muitas das nossas culpas.

Claro é que se continuarmos a não ter juizo, então tudo o que diz é musica celestial.

Um programa de desenvolvimento industrial

Até aqui o exame das condições em que se encontra a nossa industria e os meios de que ela dispõe para se desenvolver. Agora, o sr. Aboim Inglês com aquela autoridade que lhe conquistou o estudo e a experiencia, passa a explicar o que deviamos fazer para fomento dessa mesma industria.

Em primeiro lugar, devemos defender as industrias que já temos; depois, produtos fabricados com matérias primas portuguesas; em seguida, devemos reduzir as nossas importações principalmente de produtos fabricados, intensificando o mais possivel a nossa produção, e a primeira industria a intensificar seria a agricola; por ultimo, devemos saldar os nossos «deficits» agricolas sob pena dos cambios com Portugal continuarem no descalabro em que estão.

O ilustre conferente é de opinião que poderemos irrigar 400.000 hectares de terrenos baixos em Trás-os-Montes, Beira Baixa, Extremadura e Alemtejo, o que se pode efectivar gastando 8 000 contos anuais durante 10 anos, devendo depois do quinto ano o rendimento das primeiras obras já as ter amortizado.

É preciso já fazer um estudo dos nossos rios, das albufeira a construir e das zonas de irrigação possiveis e imediatamente ir construindo a albufeira de Aviz e mais obras adjacentes.

Já noutras conferencias tem exposto como julga que, em dez anos, nós podiamos produzir todos os cereais que precisamos, saldando ao mesmo tempo os nossos «deficits» agricolas.

Sendo necessario defender e desenvolver as industrias que temos, embora se espere que outras mais importantes venham a implantar-se em Portugal, o orador entende que temos de manter e procurar os melhores mercados para a venda dos produtos que exportamos, e manter e procurar os melhores mercados para a compra das materias primas. Isso obtem-se pela aproximação por meio de tratados com as nações estrangeiras. Eis por que aconselha um entendimento economico com a Espanha, porque, assim, defenderiamos com mais resultado alguns produtos que exportamos, tais como vinhos, cortiças, conservas: alem de que a Espanha pode e deve ser um grande mercado para os nossos produtos coloniais e nós podemos ser para eles um bom mercado para os seus ferros.

As obras de fomento que julgo indispensaveis desde já são: irrigação dos terrenos que a isso s prestem, aproveitamentos dos carvões nacionais e aproveitamento das quedas d’agua e navegação dos nossos rios. Para a sua execução era preciso fazer: um emprestimo interno que só fosse empregado nas referidas obras, e um emprestimo externo que nos habilitasse, se maior agravamento cambial, a comprar as maquinas e mais produtos que no estrangeiro tenhamos de adquirir.

Com essas obras criariamos «milhões de contos de réis» de riqueza que valorizariam a nossa moeda e nos abririam novos horisontes no futuro.

Para o emprestimo externo só vê possibilidades de o lançar na America ou em Espanha, preferindo esta porque as afinidades de interesses nos criariam facilidades de aproximação economica que julga convem ás duas nações.

Como intensificar algumas industrias

Em seguida, o sr. Aboim Inglês cujo admiravel trabalho sugestiona o numerosissimo auditorio, faz referencia a algumas industrias que necessitamos defender, ampliar e implantar.

Conservas de peixe: Esta industria atravessa neste momento uma crise perigosa.

Era preciso uma potente organização de credito que lhe emprestasse dinheiro sobre o produto fabricado, fiscalisando ao mesmo tempo o fabrico e assim não haveria a concorrencia produzida pela necessidade de liquidação que ha nos mercados estrangeiros desvalorizando o produto e as qualidades seriam melhores.

A cortiça: Em 1913, exportamos 88.214 toneladas, e, em 1902, 86.192 toneladas, verificando-se que nestas entravam apenas 5% de produtos fabricados.

Nós produzimos 65 % da cortiça que se produz no mundo; depois vem a Espanha e depois França. Deviamos combinar com estas nações e com a Inglaterra e fazer uma fabrica de todos os produtos da cortiça em regime de porto-franco em Lisboa e outra na Catalunha e os produtos fabricados sairem daqui e de lá completamente terminados.

Nunca houve melhor oportunidade que a presente para intentar esta operação. Os principais compradores de cortiça virgem e em bruto eram os alemães, os contratos que havia ates da guerra estão nulos, o mercado ainda não tomou rumo; deviamos pois fixa-lo na Peninsula.

Uma sociedade em que os proprietarios de cortiças, actuais fabricantes e negociantes e os operarios entrarem interessados nos lucros, não terá grandes dificuldades materiais de formação; quanto mais somar aos grandes capitais que assim ficariam conjurados se poderia juntar o auxilio dos emprestimos pelo regime dos Armazens gerais, que podiam assim ampliar o auxilio que já prestam a esta industria.

Grandes existencias de cortiça se acumularam durante a guerra e que estão sendo vendidas pelo mesmo preço que antigamente. Entende o conferente que, emquanto se liquidam as existencias actuais deve o Estado negociar um entendimento com a Espanha e a França, como produtores, e com a Inglaterra pelos contratos das casas inglesas estabelecidas em Portugal que porventura possa haver para harmonizar nas medidas a tomar.

Entretanto, devem-se aumentar os direitos d’exportação a partir de determinado prazo, que dê tempo a montar as fabricas necessarias para que se não sinta a falta de exportação.

Fabricando aqui toda a nossa cortiça quadruplicaremos essa fonte de ouro que se elevaria a uns 40.000contos anuais o minimo.

Industria de tecidos d’algodão: Esta industria é muito importante entre nós. É preciso que patrioticamente se desenvolvam emprego dos seus produtos que rivalisam em perfeição com o melhor que ha no estrangeiro e que os governos estudem com as Associações Industriais a forma de tornar efectiva a cultura do algodão na provincia de Angola, onde ele se dá optimamente, para que possamos rapidamente deixa de importar algodão estrangeiro, importação que nos absorveu em 1917 mais de 15.000 contos.

Tecidos de lã: Tambem é bastante importante esta industria entre nós. Em 1913, importaram-se de lã em bruto, fios e tecidos, 2.877.423$00; em 1917, 2.345.048$00.

Devemos tambem neste ramo procurar desenvolver o gosto pelos tecidos nacionais para diminuir a importação.

Industria do vidro: Importamos em 193, 591 contos; exportamos, em 1917, 412 contos. Convem animar esta industria para que a exportação continue e anmente, pois temos bastante e boa materia prima.

Industria do cimento e cal: Temos magnificos marnos e podemos criar uma grande industria de exportação.

Refere-se, depois, o sr. Aboim Inglês á situação e ao futuro das industrias do cacau e ceramica, aos produtos coloniais, ás industrias metalurgicas, aços e folhas de flandres, para, em seguida, mostrar que as «pautas aduaneiras» precisam revistas para deixarem de ser uma rigida fonte de receita, sem as modalidades que o nosso fomento industrial requere; que a «contribuição industrial» deve ser tambem remodelada, devendo o lançamento fazer-se sobre os produtos fabricados com taxas progressivas sobre os lucros e nunca com a uniformidade injusta em que agora se molda.

Tambem o «ensino industrial» necessita remodelação: as escolas devem produzir bons operarios e não burocratas como estão produzindo.

Trabalhar! Economizar! Produzir!

E, terminando, diz com sincero entusiasmo:

- Senhor Presidente: Tenho o convencimento intimo, que me dá dado pelo conhecimento dos recursos nacionais, que a nossa situação, embora gravissima, ainda se pode remediar, se todos praticarmos os três Evangelhos que o Diario de Noticias divulgou na sua primeira pagina:

Trabalhar!/ Economizar! / Produzir!

Trabalharemos, pois, com método, com honestidade e com energia: cada um na sua especialidade; dando «a Cesar o que de Cesar for!»

Economizemos tudo o que pudermos dispensar, banindo dos nossos habitos tudo o que não esteja em relação com os nossos meios!

Produzamos o maximo de que somos capazes. E, então, com os olhos fitos na Patria, assistiremos, com a satisfação de para isso termos contribuido, á sua redenção.

Ao terminar a sua interessantissima exposição, feita com um dessassombro e uma coragem que neste momento, mais do que nunca, se impõe, o sr. Aboim Inglês, que fora frequentemente apoiado nas suas valiosas considerações, foi saudado, com o mais caloroso entusiasmo por uma vibrante e prolongada ovação de publico, sendo ainda, ao descer da tribuna, cumprimentado particularmente por muito dos assistentes.


Referência bibliográfica

[n.d.] - "O problema industrial" in Diário de Notícias de 28 de Março de 1920, nº. 19512, p. 1 (c. 1-4). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=2306.



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