A encefalite letargica
O sr. dr. Ricardo Jorge numa notavel oração scientifica estuda a terrivel doença
Com extraordinaria concorrência de professores, medicos e alunos da faculdade de medicina prosseguiu ontem com interesse crescente a discussão do momentoso assunto – encefalite letargica – que está despertando uma notável curiosidade entre o publico e nomeadamente entre a classe medica.
Á reunião de ontem presidiu, como nas anteriores, o professor sr. dr. Ricardo Jorge que foi escutado no mais religioso silencio.
Principiou o ilustre director dos serviços de saude por dizer que vinha para aprender e não para ensinar, referindo-se depois, ás comunicações apresentadas á Sociedade de Sciencias Medicas, frisando que o primeiro caso ali apresentado deve-se aos distintos clínicos srs. drs. Cancela d’Abreu e Assis Lopes.
É para notar que os tratadistas estrangeiros se referiram raras ao nome de Portugal nas suas estatisticas de epidemias pois, segundo afirmam, lhes faltavam sempre elementos subsidiarios, para o fazerem.
Está, porem, convencido que outro tanto não acontecerá com a encefalite letargica por isso que o nosso subsidio será o mais possível satisfatorio.
O titulo de encefalite letargica é mandiz – pois que a doença pode não ser letargica e pode não residir no encefalo.
Será, portanto, correcto chamar-lhe antes encefalite epidemica.
Informa de que no começo apareceram incredulos que não se convenciam da existencia da novidade, constituindo-se porem a propria em argumento convincente surgindo com e carácter pandemico. Começou em Viena d’Austria, aparecendo em seguida, na França e Inglaterra simultaneamente e a seguir na Italia, na Belgica, em Portugal, Espanha, Polonia, nos Estados Unidos na India, América, Tunis e Perú.
O orador, após este interessante proloquio deteve-se demoradamente no estudo scientifico da molestia, revelando informes deveras curiosos e ineditos que foram muito apreciados pelo auditorio.
Lembrou que, quando em abril foi á reunião do Comité Internacional de Higiene apenas podia fazer menção de 11 casos em Portugal.
No seu regresso, porém, verificou que tinha havido uma lufada, contando-se os casos por algumas dezenas. Todos os distritos de pais estão inçados, frizando que parece haver uma maior incidência na cidade de Lisboa e nos concelhos limítrofes.
Põe em duvida a contagiosidade e não concorda com o papel atribuído aos portadores do germens. Os elementos epidemilogicos ainda não permitem ilações sobre preferências de idade, sexo, etc.
Passando á descrição clínica, o orador refere-se em detalhe á febre, á letargia, ás algias, hipocinosias e hipercinestas e sequelas e passa em revista as constatações de anatomia patológica, que marcam a doença uma sede prevalentemente mesencefalica e acentua que o que decide o prognostico são mais as localizações do que a Infeciosidade.
Estuda depois o lugar da encefalite letargica entre as encefalites até aqui conhecidas, alargando-se em considerações sobre as suas relações com a influenza para, valendo-se de argumentos epidemiologicos, clinicos e anatomo-patologicos, negar a ligação etiológica entre as duas entidades mórbidas.
Admite que a actual vaga epidémica tende para o seu fim, sendo certo tambem que cerca de 80.000 dos casos são curaveis.