Envelhecer, é morrer muitas vezes...
Esta deformação do celebre verso de Harancourt é uma resposta bem achada á nova idéa lançada pelo Doutor Doyen, que, como outr’ora Emile de Girardin, se esforça por ter uma cada dia.
A mais recente, consiste em afirmar a possibilidade de prolongar a vida humana até à idade attribuida aos patriarchas da Biblia, de que Mathusalem é o prototypo.
O doutor Doyen é uma intelligencia, um mathematico preciso. Secciona um membro ou faz a ablação d’um orgão com a mesma precisão que Henry de Poincaré resolve uma equação de qualquer grau.
Foi no decimo congresso de medicina, que acaba de se realisar em Genebra, que o celebre operador formulou a sua affirmação: “Está na mão do homem (entenda-se a especie inteira, sem distincção de sexo) conservar a vida durante muitos seculos”.
Interrogado por um jornalista francez, o doutor Doyen confirmou por estas palavras a declaração que fizera em Genebra:
p. 2 “ As minhas experiencias não são mais do que o corollario dos trabalhos do doutor Metchnikoff, que descobriu a “phagocytose”, base dos meus estudos. É a elle que devemos o conhecimento do mechanismo intimo da vida.
Mas até agora as experiencias limitavam-se ao laboratorio. Julgo ter chegado a resultados uteis.
Multiplicando os globulos brancos, augmentamos o coefficiente de resistencia vital que podemos avaliar. É uma nova therapeutica que parece nascer. Se conseguirmos supprimir a constipação, a angina, a bronchite (e tenho obtido successos absolutos), pontos de partida, muitas vezes, do rheumatismo, chegamos, por corollario, a supprimir as intoxicações latentes.
“A nossa vida – prosegue o dr. Doyen – é limitada por uma infinidade de deteriorações do organismo; entre estas, devemos considerar não só as doenças apparentes, mas tambem as infecções latentes. Se provocarmos, graças aos liquidos phagogenos, uma acção de defeza que augmenta a resistencia do individuo, prolongamos consequentemente a duração da vida.
A lei da conservação do organismo humano está proposta.
O que é mais interessante, conclue o sabio sorrindo, é que é um cirurgião que assenta as bases de uma therapeutica, que talvez, transforme completamente toda a medicina”.
Metchnikoff continua
Tornava-se urgente, depois de tão formidaveis declarações, remontar á propria origem, isto é, ao proprio Metchnikoff, cujas experiencias ácerca da velhice são notaveis. O mestre da bacteriologia, um dos dois grandes herdeiros de Pasteur, falou. Eis o que elle disse:
A communicação do dr. Doyen é das mais interessantes, mas desconheço as suas experiencias. Não posso portanto julgal-as. Mas ácerca do assumpto, na essencia, penso que, certamente, no futuro, poder-se-ha prolongar a vida humana. Para attingir este fim, será preciso, primeiro, chegar a determinar em toda a sua extensão as causas da velhice. Estas causas ainda não estão perfeitamente definidas. Trabalha-se n’isso, trabalhamos para isso. Nada é ainda absoluto e é preciso que a humanidade se contente em esperar.
Conclue
[n.d.] - "Poderá a sciencia prolongar a vida? - Certamente, dizem Metchnikoff e Doyen - Hum! Dizem Debove, Variot e Achard - Tenho a certeza, dizia outr’ora Descartes"
in Diário dos Açores
de 9 de Outubro de 1908, nº. 5201, p. 1-2 (col. 6; 1). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=2557.