CRONICAS MEDICAS
Ás minhas leitoras
Nem tudo são desvantagens na velhice. Com ela adquire-se pelo menos, quando demasiados achaques ou desmedidas ambições não atribulam a vida, uma grande tolerancia para pequeninos erros. Sabe-se que todos temos pequenas manias, e que os grandes homens que forçaram as portas da historia as tinham tambem. Um grande homem, de indiscutivel superioridade de espirito, pode ter grande desgosto por ser calvo. A mulher mais virtuosa, de maior dedicação pelo marido e pelos filhos, pode sentir-se infeliz no dia em que lhe aparecerem os primeiros cabelos brancos. Futilidades dirão os novos, ou aqueles que presumem de espiritos fortes para o que, ás vezes, o proprio espirito lhes falta. Não são, no fundo, futilidades. São formas por que se exprime o desejo de parecer bem, de agradar, precioso para a conservação daquela sociabilidade sobre que assenta a vida dos homens. Para que o nosso convivio se torne estimado, aprendemos a dar aos nossos pensamentos expressão adequada de voz e de gosto. Do mesmo modo como preparamos o espirito, podemos preparar o corpo, pelo vestuario e pelos meios que tornem o seu aspecto mais agradavel. É isso até uma homenagem ás pessoas com quem convivemos, um dever para com elas. Sómente os exageros, como em tudo, são de censurar.
Vem isto a proposito de varias cartas em que me pedem conselho sobre cremes para a pele do rosto, tinturas para cabelos, etc., etc, cartas a que raramente posso dar resposta satisfatoria porque nunca cuidei de estudar especialmente a materia em questão. São, pela maior parte, cartas de senhoras, e é esta a razão porque lhes dedico esta singela cronica.
Confessada a minha ignorancia, e feita a afirmação de que julgo louvaveis as tentativas para melhorar o aspecto exterior de quem quer que seja, cabe-me entrar no que é propriamente o assunto dêste artigo: É que me veio ás mãos um artigo recente dum jornal medico estrangeiro em que é versada materia respeitante a esta questão. O medico articulista defende o emprego dos cremes para a pele do rosto. O frio, o calor, o sabão, os ventos, tudo isso irrita as peles demasiadamente finas que precisam ser resguardadas, quasi se poderia dizer revestidas, pelos ditos cremes ou pomadas. Aconselha-se uma preparação de oxido de zinco com lanolina e vaselina, que pode aromatizar-se, por exemplo, com verbena. Claro é que não basta depois, para as habituais abluções, a simples agua quente ou fria. Tem de limpar-se o rosto com algodão embebido num oleo, e tirar este com um dissolvente das gorduras: por exemplo, uma mistura de acetona, alcool e agua distilada [sic].
É evidente que por cima das pomadas ou cremes se deve pôr um pó, córado ou branco, que a ele adere, para que o rosto não fique luzidio.
Este tratamento convém a uma pele fina, facilmente irritavel, mas não a uma pele doente que, conforme os casos, terá seu tratamento proprio. Por exemplo, a seborreia trata-se, comumente, com preparados de enxofre.
De tinturas para os cabelos ha varias especies[.] Todas elas são prejudiciais para o cabelo, que tornam mais fragil, e algumas podem produzir intoxicação. Estão neste caso as côres derivadas da anilina e dos sais de chumbo.
Como descórante, emprega-se hoje exclusivamente a agua oxigenada. Como córante, as duas côres vegetais: «heuné» (roxo) e «indigo» (azul), cuja mistura dá castanho dourado, mais ou menos carregado. E ha ainda diversas tinturas metalicas.
A preparação dessas tinturas não é muito simples, e quem não tem pratica, mesmo que possua a formula, corre o risco de não conseguir uma preparação perfeita. Tambem os cremes, pomadas ou pastas exigem cuidadosa [e] demorada manipulação.
Do artigo que aludo mais não consta de aproveitavel. Fala-se ainda de operações praticadas na America, tirando pedaços de pele da cabeça para repuxar e desenrugar a do rosto. Essas operações, o autor condena-as. Eu tambem.
F. MIRA.