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A CURA DA TUBERCULOSE e a invenção do medico dinamarquês Moellgaard

VAI Á DINAMARCA UMA MISSÃO PORTUGUESA

Mil vezes têm os jornais de todo o mundo noticiado a descoberta de processos de cura da tuberculose. De vez em quando, uma agencia envia nas seis linhas laconicas dum telegrama os resultados do labor dum sabio, anos e anos curvado sobre a mesa dos laboratorios, ou num recanto de revista medica um artigo aparece, discutindo as maravilhas dum novo sôro milagroso. Contudo, nos sanatorios e nos hospitais, nos palacios e nos casebres, dia a dia vão morrendo centenas de enfermos, roídos pelo terrivel mal, que até hoje, por mais processos e preparados que se tenham contra ele descoberto, não tem encontrado remedio certo e indiscutivel.

As estatisticas, na sua crudelissima secura, é que dizem todos os anos a verdade crúa. De braço dado com o cancro, a negra tuberculose vitima anualmente 25 a 30 % dos doentes de todo o mundo. Um resfriamento. Uma ponta de gripe. Um pulmão que se esfarela. E mais um que tomba e vai dormir o derradeiro sôno debaixo da terra fria. Outras vezes, são os ossos que amolecem, os intestinos que se desfazem, a pele que se avermelha e gangrena. São todos os horrores, todas as manifestações dessa enfermidade fatal, que entrega a todo o instante repasto sobrado aos vermes dos cemiterios.

Sucede, contudo, sempre que os jornais anunciam nova panaceia, novo sôro miraculoso, novo xarope redentor, que um fremito de esperança e de saude agita, pela curva da terra, os milhões de almas sofredoras. Nos catres a febre desce, a tosse pára, o brilho dos olhos, o rosado falso das faces, as dôres, as pulsações do coração cansado, abrandam, normalizam-se. Revive-se. Nos salões dos grandes hoteis de Arosa e Davos, quando a noticia chega, a musica do «jazz-band» é mais clara e mais fresca, e lá por fóra, nos topos nevados dos montes, o sol até parece que é mais puro e mais louro. Ressuscita-se.

Meses depois as desiluções chegam. Os medicos encolhem os ombras [sic] em frente da droga, inutil em certos casos, franzem o nariz perante o remedio falivel. E os doentes vão tombando como folhas, nos grandes outonos traiçoeiros, vão desmaiando como rosas brancas, nas primaveras enganadoras.

Mas parece que, desta feita, a noticia consoladora é segura, certissima. Pelo menos, grande revolução tem feito no mundo scientifico. A cada passo, a afirmação ganha vulto e convicção, certeza.

- Está descoberta a cura da tuberculose!

Realizou-se o milagre? Estaremos em face da maior descoberta do Seculo, da maior descoberta da Sciencia? É de crer que sim.

O heroi, o santo, o Deus para o qual se volvem neste momento, olhos extasiados, rasos de esperança, chama-se Moellgaard.

O dr. Moellgaard, professor em Copenhague, encontrou certo dia um sal de ouro, a «sinocrisina», que destruía radicalmente o conhecido bacilo de Koch. Matava o bacilo, mas (e uma cruel adversativa surgiu) libertava substancias venenosas do [sic] organismo, que aniquilavam o doente. Finava-se da cura o pobre enfermo! O professor Moellgaard não desanimou, contudo, e pouco tempo depois arranjava um sôro que neutralizava a formação de toxinas, derivadas do emprego do sal de ouro descoberto. Estava resolvido o problema.

Os ensaios que se fizeram então deram os melhores resultados. A imprensa de todo o mundo começou ocupando-se do assunto. O «Diario de Noticias», ultimamente, nas suas paginas especiais do Porto, deu-lhe um devido desenvolvimento.

E acabamos de ser informados que o governo português, a instancias diversas, e muito principalmente pelo esforço que perseverantemente fez nesse sentido o Instituto Pasteur de Lisboa, acaba de nomear o ilustre professor sr. dr. Pulido Valente, e o seu assistente sr. dr. Cascão de Anciães, para tomarem parte numa reunião de medicos de todos os países, que dentro de breves dias estarão em Copenhague, a convite do professor Moellgaard.

Vão os dois insignes facultativos confiados no bom desempenho da sua misssão. A reunião de Copenhague tem uma importancia indiscutivel, pois nela vão ser submetidos á apreciação das sumidades clinicas de varios países os resultados do tratamento da tuberculose pelo novo produto.

Louvamos o governo português pela iniciativa que tomou, e estendemos esse louvor ao Instituto Pasteur, que desde o aparecimento dos primeiros trabalhos se tem empenhado em obter a vinda para Portugal de tão notavel meio terapeutico. Tendo estabelecido esse Instituto correspondencia com o dr. Moellgaard, deste obteve o convite para que o nosso país se fizesse representar na proxima reunião medica de Copenhague. Posteriormente, esforçou-se tanto quanto possivel para que o governo nomeasse a missão scientifica.

Foram nomeados os dois ilustres clinicos, a que nos referimos anteriormente. Vão cheios de esperanças. Ouvirão. Estudarão. E procurarão, depois de concluidos os seus estudos, que o medicamento seja introduzido em Portugal, fazendo-se a sua distribuição e aplicação, segundo as intruções [sic] que directamente receberem do professor Moellgaard, seu inventor.

Os srs. drs. Pulido Valente e Cascão de Anciães partem na proxima quarta feira. Com eles parte a esperança de todos quantos sofem do terrivel mal, de todos quantos o sentem rondar perto de si ou dos que vivem no afecto do seu coração.

Que voltem breve, trazendo alegria, saude e vida.


Referência bibliográfica

[n.d.] - "A CURA DA TUBERCULOSE e a invenção do medico dinamarquês Moellgaard" in Diário de Notícias de 1 de Março de 1925, nº. 21232, p. 1 (c. 5). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=2747.



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