Base de Dados CIUHCT

Divulgação Científica em Jornais



Texto da entrada (ID.2771)

CRONICAS MEDICAS

As digestões e os nervos

Dispepsia é um termo vago de que usam os medicos e quere sómente dizer – má digestão. Ha, portanto, grande variedade de dispepsias: umas referentes a estomago, outras relativas aos intestinos; umas tendo por causa a debilidade de contracções de qualquer porção do tubo digestivo, outras que provêm da deficiencia de alguma das varias secreções que modificam as substancias que ingerimos.

Em certos casos pode acusar-se o sistema nervoso de causador da dispepsia. Todos os nossos orgãos estão sujeitos á influencia nervosa, mesmo os que trabalham independentemente da acção da vontade e até sem o nosso conhecimento. Podemos nós dirigir o trabalho do estomago? Por modo nenhum. Desde que os alimentos nos passam da bôca, deixamos de ter acção sobre eles; e todo o trabalho digestivo se passa ignorado de nós proprios, sem qualquer rebate ou sinal de que se está relizando, a não ser quando corra mal e essa anormalidade se manifeste por dôres, por nauseas, por enfartamento ou qualquer outro sintoma de doença.

Exerce-se o trabalho digestivo independentemente da acção de vontade, mas não independentemente de acção nervosa. Suponha o leitor que, por acidente ou por crueldade sua de experimentador, tem um cão com uma fistula no estomago, isto é, com uma pequena rotura na parede do estomago, de onde resulte a comunicação com o exterior. Mostre a esse cão um pedaço de carne, sem mesmo lho chegar ao focinho, e verá escorrer suco gastrico pela fistula, aquele suco que o estomago segrega e que tem poder de digerir a carne. É um caso de influencia dos nervos sobre fenomenos digestivos, tendo ainda de notavel que o excitante não tem contacto com o organismo do animal.

De resto, não era necessario que um russo, de nome Pawlow, tivesse posto em destaque esta experiencia para que acreditassemos nessa influencia nervosa. Ponha-se o leitor, se é guloso, a admirar uma montra de pastelaria e verá como lhe cresce agua na bôca.

Se isto assim é, compreende-se bem que certas dispepsias tenham origem nervosa, como tambem se compreende que certos estados nervosos tenham origem dispeptica. Toda a gente sabe que algumas dôres de cabeça, vertigens e mesmo estados nervosos de tristeza estão frequentemente ligados a perturbações digestivas e desaparecem ou se atenuam quando as digestões passam a fazer-se regularmente.

Em alguns infelizes doentes estabelece-se um verdadeiro circulo vicioso: o tubo digestivo funciona mal, e por motivo desse mau funcionamento arrazam-se os nervos; depois, como estes sofrem, não regulam como devem as funções digestivas e a dispepsia agrava-se. O doente nem sabe a quem dirigir-se: se ao doutor do estomago, se ao doutor dos nervos. Sabe sómente que sofre.

Nestes casos só se pode obter bom resultado combatendo simultaneamente o estado nervoso e o estado dispeptico, e enchendo-se de paciencia o medico e o doente. O primeiro para ouvir as queixas dum doente que desespera de curar-se; o segundo para suportar tratamentos que, habitualmente, só quando prolongados são eficazes.

F. MIRA.

(...).

[NOTA - segue-se uma pequena série de respostas a leitores]


Referência bibliográfica

F. MIRA - "CRONICAS MEDICAS" in Diário de Notícias de 20 de Maio de 1925, nº. 21311, p. 3 (c. 1). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=2771.



Detalhes


Nome do Jornal


Mostrar detalhes do Jornal

Número

Ano Mês Dia Semana


Título(s) do Artigo


Título

Género de Artigo
Opinião

Nome do Autor Tipo de Autor


Página(s) Localização do Artigo na(s) página(s)


Tema

Outros
Palavras Chave


Notícia