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A missão oceanografica

e a pesca do atum e da sardinha

Ha cêrca de cinco anos que a Direcção Geral de Marinha, por intermedio da Direcção de Pescarias, principiou intensificando os estudos oceanograficos, tão uteis num país como o nosso, que na pesca tem uma das suas melhores fontes de riqueza. Para isso pensou aproveitar o Aquario Vasco da Gama, que a Sociedade Portuguesa de Sciencias Naturais, em 1908, organizara como estação de biologia maritima.

Porém, faltando pessoal competentemente habilitado para atingir essa finalidade, o Estado nomeou o dr. Alfredo Ramalho, á data assistente do Aquario, para ir em comissão a França aperfeiçoar-se nos estudos dessa especialidade.

Em cumprimento dessa determinação, o sr. dr. Alfredo Ramalho trabalhou alguns meses a bordo do «Tanche», navio oceanografico francês, e na companhia de Mr. Helott, actual director da estação oceanografica de Salambô, perto de Cartago, fez largos cruzeiros no glofo de Gasconha, nas costas de Portugal e no Mediterraneo. Foi á Turquia, fez parte de varias missões de estudo em diversos países, chegando até a permanecer três meses em Bergen (Noruega) no Instituto Oceanografico do professor Helland-Hansen, considerado como um dos primeiros oceanografos da actualidade.

Havendo, pois, alguem devidamente preparado para o bom desempenho da missão scientifica que se pretendia organizar, faltava apenas arranjar um navio adequado. Foi o «Aviso Cinco de Outubro», em tempo, aproveitado em missão oceanografica, mas como actualmente os estudos hidrograficos dele tiveram precisão, resolveu-se mandar proceder á construção dum navio especialmente destinado a estudos de pesca, o «Albacora», saído dos estaleiros da Noruega, armado sob a direcção scientifica do professor Helland Hansen, e muito parecido com o «Armauer-Hansen», navio oceanografico do Instituto de Bergen.

O navio é do tipo «Ketech», armação muito usada nos bancos dos mares do norte e de grande semelhança com as nossas chalupas. É pequeno, elegante, muito airoso quando desfralda suas velas brancas, e tem bom andamento.

Chegou a Lisboa em dezembro, e na sua primeira viagem de serviço nas costas de Portugal, desde 18 de maio a 9 de julho, tendo apanhado bom vento, fez em dois dias e meio, á vela, a travessia de Portimão ao Funchal. O navio aguenta-se muito bem, e apesar do seu muito balanço oferecer poucas comodidades, a amabilidade dos tripulantes torna agradabilissima a permanencia a bordo. O «Albacóra» tem um belo motor a oleos pesados, mas como o seu comandante, 2.º tenente Zola da Silva, é um apaixonado pela vela, quasi sempre nessa viagem assim navegou, economizando combustivel e tornando dessa forma os estudos menos dispendiosos para o Estado.

A primeira viagem estendeu-se ás Ilhas Selvagens, perto das Canarias, ocupando-se dos dois principais assuntos sobre que actualmente incide a atenção do Aquario, e que são a biologia do atum e a da sardinha.

A missão scientifica era formada pelo director do Aquario Vasco da Gama, dr. Alfredo Ramalho, pelo naturalista do Museu Bocage, Fernando Frade, e pelo preparador Fernando Mendes.

Estes estudos sobre a sardinha e sobre o atum, oferecem neste momento um interesse muito especial, em virtude da enorme escassez de peixe que ultimamente se tem notado nas aguas portuguesas.

A missão procurou conhecer as causas dessa escassez, estando actualmente a organizar os inumeros elementos de estudo colhidos para disso tirar as respectivas conclusões. Tão cedo, porém, não poderão deduzir o que pretendem. Os trabalhos oceanograficos são dificilimos, e os seus resultados tardam sempre a ser conhecidos. Só agora, por exemplo, é que os espanhois publicaram o resultado de estudos analogos aos que a nossa missão procedeu e que por eles foram feitos em 1923.

E só nos começos deste ano é que um notavel sabio alemão, Ekrenbaum, publicou tambem os resultados de trabalhos oceanograficos feitos em 1911 e 1912!

A missão portuguesa voltará de novo para o mar, no mês de agosto proximo, a prosseguir a sua missão. Nesta ultima viagem, quando na Madeira, fizeram varios cruzeiros ao largo, no intuito de verificar a maneira como ali se pesca o atum. Os barcos madeirenses fazem a pesca á linha, deitando os anzois fóra da borda.

O «Albacóra», na volta a Portugal, ensaiou este processo, mas como só num dia pôde fazer esta experiencia, não é possivel ainda dizer se tal processo dará ou não resultados nas nossas costas. Repetirá o sistema no segundo cruzeiro.

De uma maneira geral, podemos informar que os estudos principais feitos na primeira viagem, se estabeleceram acêrca do crescimento do atum e sardinha, epoca e local da postura e imigrações, assuntos estes de muito interesse para os armadores.

Verificou tambem a missão que, neste problema da pesca, a fiscalização deixa muito a desejar, não por culpa da nossa marinha, mas porque os pescadores espanhois são quasi sempre avisados da saída das canhoneiras, que antes de sairem para o mar fazem, como é natural, em terra, compras de mantimentos, etc. Os infractores, avisados por amigos, dos pontos onde elas se encontram, vão para outros locais, ou aguardam ocasião mais propicia para pescarem á vontade, sem risco de serem apresados. Depois, as canhoneiras andam pouco, e os pescadores espanhois, muitos deles, tendo barcos de melhor marcha, quando avistam ao longe o vulto inconfundivel desses navios de guerra, fogem, e distanciam-se de maneira a não poderem ser capturados. Muitas vezes nem são vistos pelos barcos da fiscalização. Por isso, se de tais serviços fôssem encarregados barcos pequenos, gasolinas, etc., muito rapidos e sem tipo conhecido, que saissem para o mar a qualquer hora, aparecendo em toda a parte quando não fôssem esperados, então é que a fiscalização daria resultados praticos.

Ao director do Aquario Vasco da Gama está merecendo tamanho interesse a questão do atum e da sardinha, mesmo sob o ponto de vista economico, que tem já organizada e pronta no Aquario uma sala onde mandou colocar uma enorme vitrine para nela fazer uma exposição permanente de produtos de conservas portuguesas. Deseja essa entidade que todos os industriais de conservas mandem para ali mostruarios, fotografias e tudo quanto caiba nos moldes e fins dessa exposição, por todos os titulos interessantissima e util.

[NOTA - Contém quatro fotografias, cujas legendas são: “Barco madeirense empregado na pesca do atum á linha junto do Porto Santo – Saindo para a pesca da sardinha em Portimão – «Albacora» em Portimão pouco antes de largar para a Madeira – O «Albacora» navegando ao largo do Algarve”]


Referência bibliográfica

[n.d.] - "A MISSÃO OCEANOGRAFICA" in Diário de Notícias de 22 de Julho de 1925, nº. 21374, p. 2 (c. 1-3). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=2839.



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