Uma conferencia notavel
A organização sanitaria na Dinamarca
e a luta contra as doenças epidemicas e outras
O sr. dr. Artur Ridardo [sic] Jorge, filho de eminente professor e ilustre homem de letras que toda a gente conhece e admira, fez parte em 1924 de uma missão de estudo enviada pela Sociedade das Nações á Dinamarca, terceira do genero em que figurou um português.
As condições em que esta missão visitou a Dinamarca foram excepcionalissimas; por toda a parte se lhe abriram as portas de par em par, sem nada ficar esquecido desde a organização e o funcionamento ás dotações e aos resultados praticos; desde o papel do Estado á iniciativa particular, desde os opulentos estabelecimentos nacionais ás mais humildes casas perdidas nos campos – tudo esquadrinhado com um excesso de minucia, comparado, discutido, criticado pelas vozes diferetnes [sic] dos membros duma missão internacional, onde figuravam 21 paises europeus e americanos.
Desta soma acumulada de documentos de toda a especie soube o ilustre medico, que é tambem professor como seu pai, aproveitar-se para na Sociedade de Sciencias Medicas de Lisboa, ilustrada com quadros, graficos e numerosas projecções, traçar da Dinamarca um quadro cheio de relevo, apesar da sua conferencia se limitar apenas aos aspectos de higiene publica e ter reservado para futura conferencia todas as interessantissimas questões de aspecto medico-social, como a legislação social, o cooperativismo modelar na Dinamarca – a protecção á infancia e a inspecção escolar, a luta contra o alcoolismo, a assistencia aos velhos, aos invalidos, aos sinistrados, aos alienados, a assistencia hospitalar, etc., etc.
Limitando-se embora aos aspectos da higiene fez sobressair o grau avançado da civilização da Dinamarca – para a qual se tornou necessario criar uma categoria nova entre os países civilizados, em que viriam enfileirar-se a Suecia, a Noruega, a Holanda e a Suiça, entre os quais a Dinamarca seria o país hiper-civilizador por excelencia.
Começou o ilustre conferente por uma rapida introdução acêrca do país e dos seus habitantes (…).
A luta, na Dinamarca, contra a tuberculose
Foram do maior interesse as informações trazidas da Dinamarca pelo sr. dr. Artur Ricardo Jorge – fruto do seu estudo e observação – sobre a luta contra as doenças epidemicas, a tuberculose, a sifilis e o cancro. O Estado distribui para isso dinheiro a rodo. Só para o combate das doenças epidemicas, – devendo notar-se que as epidemias graves já ha muito desapareceram, – o orçamento para 1923/24 fixava a verba [de] 2 milhões e meio de corôas (dez mil contos em numeros redondos da nossa moeda!)[.] Resultado: desapareceram a peste e a colera, e quasi se desconhecem o tifo, a variola e o sezonismo.
Na luta contra a tuberculose, que representa o maior esforço que qualquer nação até hoje desencadeou contra tão terrivel flagelo social, – a Dinamarca alcançou o primeiro lugar e ganhou o 1.º premio da menor mortalidade hoje apontada em qualquer nação do mundo.
O conferente referiu-se pormenorizadamente aos metodos de tratamento, descrevendo instalações e sanatorios, asilos e dispensarios, com abundante copia de projecções luminosas, citando numeros que espantam mas que ao mesmo tempo elucidam:
Bastará dizer que após a publicação em 1905 das 2 leis fundamentais – uma pautando as medidas profilacticas, outra as subvenções concedidas pelo Estado, uma obra urgente se iniciou donde resultou a construção de 20 sanatorios, dos quais 8 maritimos com 420 camas e os restantes 12 com perto de 1200; de mais de 30 hospitais com um total de cêrca de 1000 leitos; além de asilos, dispensarios, escolas espceiais [sic] para crianças tuberculosas onde a par da instrução recebida fazem curas de repouso, laboratorios para o exame gratuito das expectorações, etc.
(…)
O dinheiro particular ao serviço da sciencia e da humanidade
Para se fazer ideia do que vale na Dinamarca a contribuição particular, cite-se ainda a instituição do selo de natal – «Julemaerke» – da invenção dum empregado dos correios. (…)
Em Lisboa, onde têm morrido nos ultimos anos perto de 2 mil pessoas por ano vitimadas pela tuberculose, calcule-se quantas vidas se poupariam, se a taxa baixasse á das cidades dinamarquesas.
E de igual modo para o combate á sifilis e ao cancro, tremendos flagelos da pobre humanidade sofredora, parte da conferencia que não foi a de menos interesse com que o ilustre professor terminou esta sua primeira comunicação á douta assembleia, demonstrando assim quanto o povo dinamarquês tem mais que nenhum outro, a noção do brio nacional – o orgulho merecido pelo seu pequeno torrão natal, que se tornou por excelencia o paraizo terreal.
[NOTA - Contém uma fotografia, cuja legenda é: “«Sanatorio do fiord de Veile» para tuberculosos, o primeiro que se fundou na Dinamarca em 1900”]