Texto da entrada (ID.3118)
(desconhecimento do interior da Terra. Sabe-se o seu diametro (12.742 km), da superficie ao centro (6.371 km). Tem-se chegado a 2 km abaixo do nível do mar)
Por outro lado deixamo-nos levar muito depressa por conjecturas. Do facto da temperatura augmentar á proporção que se desce da superficie do solo, se tem concluido que a proporção deve continuar a mesma até ao centro.
Este augmento é, em media, de um gráo para trinta e cinco metros de profundidade, mas com grandes differenças segundo os logares, porque, em certos pontos, elle se dá dentro de doze ou quinze metros, ao passo que em outros exige cincoenta, oitenta ou mesmo cem. Tem-se concluido, talvez um pouco ligeiramente, que o augmento de calor deve ser de 30 graus por mil metros, de 300 por dez mil metros, de 3000 para uma profundidade de cem kilometros... e de 200.000 para o centro do globo. D’ahi se tem ensinado que todas as substancias que conhecemos achando-se fundidas a 3000 gráos, a Terra inteira é liquida, que a crôsta do nosso globo é proporcionalmente mais delgada do que a casca de um ovo, e que, positivamente, vivemos em cima de uma fornalha e dansamos sobre um vulcão.
Ora absolutamente não está demonstrada a continuidade dessa progressão observada unicamente nas camadas superficiaes. Ha poucos annos pensava-se tambem que a temperatura da atmosphera ia regularmente diminuindo desde a superficie do solo até aos ultimos limites d’esta atmosphera, e, entretanto, as acenções dos balões-sondas vieram mostrar que ao contrario, a diminuição cessa a uns quinze mil metros de altitude, segundo o ponto e as estações, e que existe alli uma espessa camada de equilibrio thermico, acima do qual o abaixamento continua. Até onde? Ignora-se completamente.
Segundo toda a probabilidade, o interior do nosso globo não é de modo algum comparavel ao de um ovo crú coberto pela sua casca, isto é, liquido ou fluido, mas, de preferencia ao de um ovo cozido, se o globo fosse liquido, com effeito, a attracção do Sol e da Lua produzia marés que passariam sob nossos pés duas vezes por dia e produziram ondulações sob a crosta do globo aliás elastica como é sabido.
Do conjuncto de considerações astronomicas e geodesicas, resulta que a massa terrestre não é liquida. A gravidade, no centro, é nulla: a pressão ao contrario, ahi attinge o seu maximo e pode elevar-se a tres milhões de kilogrammas por centimetro quadrado: tres milhões de atmospheras. A massa do globo deve estar em estado pastoso; Lorde Kelvin vae até ao ponto de affirmar que a sua rigidez deve egualar á do aço. Os abalos dos tremores de terra atravessam o globo em quatorze minutos, o que não se daria se elle fosse liquido.
Muito provavelmente esta massa ainda está quente. A terra é um planeta do systema solar, formado á custa da nebulosa primitiva. Foi, a principio, uma esphera de vapor, como Jupiter parece ser ainda hoje; depois, foi-se lentamente resfriando, condensou-se em um globo liquido, o qual, pela continuação do resfriamento, se cobriu de uma crosta solida, como verificamos, por exemplo, na superficie de um cadinho de chumbo derretido.
Esta crosta solida repousa sobre a massa pastosa. A temperatura do espaço parece ser 270 gráos abaixo de zero. O nosso planeta continua a resfriar-se e a condensar-se. N’isso reside a principal causa dos tremores de terra.
Em geral, ellas são o resultado da contracção secular do globo terrestre proveniente de seu gradual resfriamento. Esta contracção não é uniforme, aqui e ali produzem-se dobras, deformações, rupturas. As cartas de distribuição geographica dos abalos sismicos localisam-nos ao longo das grandes dobras da crosta terrestre, com especialidade na Italia, Asia Menor, Japão e ao longo da costa oriental do Pacifico, America do Norte e do Sul.
Este trabalho de contracção effectua-se continuamente e nem um só dia se passa sem que a terra trema, havendo unicamente differenças de intensidade.
Eis aqui resumido um bello artigo do nosso conhecido Camille Flammarion, sobre um assumpto de palpitante actualidade, e no qual mais uma vez elle se revela superior escriptor scientifico, pela originalidade dos conceitos e, egualmente, pela claresa com que os apresenta, pondo-os ao alcance de todas as inteligencias.
Referência bibliográfica
[n.d.] - "O interior do globo"
in Diário dos Açores
de 23 de Outubro de 1909, nº. 5505, p. 1 (col. 1-2). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=3118.
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