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Texto da entrada (ID.333)

As modernas theorias relativas à electricidade e à matéria

por

Madame Curie

(da Revue scientifique)

(continuação)

Assim, temos uma imagem bastante precisa dos atomos de electricidade negativa. O mesmo não succede na electricidade positiva. Parece existir uma dyssymetria profunda entre as duas electricidades. A electricidade positiva apparece sempre ligada aos atomos materiaes, e nenhuma razão ha, até aqui, para crer que d’elles possa ser separada.

Os nossos conhecimentos relativos á materia, foram acrescidos de um facto importante: descobriu-se uma nova propriedade da materia que recebeu o nome de radio-actividade. Nomeámos assim a faculdade que teem os atomos de certas substancias em expulsar espontaneamente particulas, das quaes algumas teem um volume comparavel aos dos proprios atomos, ao passo que outras são electrons. Esta propriedade que o uranio e o thorio possuem em fraco grao, serviu para a descoberta d’um novo elemento chimico, o radio cuja radioactividade é extremamente grande.

Entre as particulas expulsas pelo radio, algumas partem com enorme velocidade, e a sua expulsão é acompanhada com desenvolvimento de calor consideravel. D’aqui se conclue que um corpo radioactivo, constitue uma fonte de energia

A theoria que melhor conta dá os phenomenos de radioactividade, é aquella em que se admitte que, n’um corpo radioactivo, uma certa porção d’atomos se transforma em um tempo dado, com producção d’atomos de peso atomico inferior e, em certos casos, com expulsão de electrons. Esta theoria é uma theoria de transmutação de elementos, mas que differe dos sonhos dos alchimistas que, por emquanto ao menos, são impotentes para provocar ou influenciar a transmutação.

Demais, certos factos parecem provar que a radioactividade pertence a toda a especie de materiaa, ainda que fracamente. Sendo assim, a materia está longe de ser tambem immutavel e inerte, como o pensavamos. Pelo contrario, está na via d’uma continua transformação, bem que esta escape aos nossos sentidos em consequencia da sua relativa lentidão.

Este curso terá por objecto o estudo detalhado pelos phenomenos cujo conhecimento conduziu ás novas concepções que acabam de ser expostas. N’esta lição tentarei dar um resumo da genese d’estas idéas, e indicarei alguns factos importantes que lhes servem de base.

Sabe-se que nos principios do seculo passado, Coulomb e Ampère, encararam cada uma das duas electricidades como um fluido imponderavel. As forças exercidas entre as particulas dos fluidos electricos são, para elles, forças centraes, repulsão entre particulas do mesmo fluido e attracção entre particulas de fluidos differentes. A differença é proporcional á carga electrica d’uma particula e varia na razão inversa do quadrado da distancia. Partindo d’estes dados e interpretando convenientemente os factos experimentaes relativos à differença da natureza entre os conductores e os dialectricos [1], chega-se a constituir uma theoria muito completa dos phenomenos eletrostaticos. Theoria analoga pode ser estabelecida para o magnetismo, admittindo que a lei d’acção entre dois polos magneticos é absolutamente semelhante á lei da acção entre duas particulas electrisadas.

O fluxo d’um fluido electrico n’um conductor, constitue a corrente electrica.

Para estabelecer uma theoria dos phenomenos electromagneticos e electrodynamicos, é necessario fazer intervir uma terceira lei da acção a distancia, entre um polo magnetico e um elemento da corrente – lei de Laplace.

No seu conjuncto, todas estas theorias já se acham fundadas sobre leis de forças, exercendo-se a distancia, juntas á imagem dos fluidos electricos.

Faraday, ainda que contemporaneo d’este desenvolvimento, encara a questão sob um ponto de vista differente. Não crê na possibilidade de acções a distancia entre os corpos electrisados, pensando que as forças que se exercem entre elles resultam de tensões elasticas que se estabelecem no meio que os separa, tensão que está o sentido das linhas de força. Foi procurando pôr em evidencia a influencia directa do meio, que se conduziu á descoberta do poder inductor dos dialectrictos, e a sua opinião sobre o papel essencial do meio, achava-se assim fortificada. Ficou summamente admirado pela esterilidade dos seus esforços feitos para realisar uma carga absoluta, as quaes lhe appareciam sempre como as extremidades d’um tubo de força que atravessa o dialectrico.

Continua

Iman

[1] Corpos isolantes ou maus conductores de electricidade. Não sabemos se existe esta palavra em portuguez. Comtudo já na nossa lingua algumas palavras ha com o mesmo prefixo grego dia a cuja significação anda quasi sempre ligada a idéa de repulsão, separação, etc., taes como: diályse, diamagnetico, etc. Por consequencia julgamos não ser grave erro a adaptação da palavra: dialectrico.


Referência bibliográfica

Madame Curie - Iman (trad.) - "Revista Scientifica - As modernas theorias relativas à electricidade e à matéria" in Diário dos Açores de 28 de Setembro de 1907, nº. 4898, p. 1 (col. 1-2). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=333.



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