A propósito da descrição dos edifícios da baixa de Lisboa:
"Além do vetusto Banco de Portugal, dos bancos de LIsboa & Açores, do Commercial e de outros, via-se a Caixa Geral Agricola com o seu frizo de azulejos representando fructos estylisados, as suas janellas recordando aberturas de celeiros alemtejanos, tudo numa architectura solida como a propriedade fundiaria, mas recordando o bucolismo de uma ecloga virgiliana e ao mesmo tempo a transformação soffrida pela agricultura graças á chimica, á mechanica e á meteorologia. Nos cheios das paredes, medalhões representando Liebig, Chaptal, Pasteur, Ferreira Lapa, Matheus Dombasle, e altos relevos alludindo aos trabalhos proeminentes destes illustres sabios concorriam para dar idéa dos intuitos deste estabelecimento, justificando um grupo de marmore representando Ceres e a Sciencia moderna estreitamente abraçadas e circuitadas de instrumentos de laboratorios, de retortas, de ceifeiras enormes.
Poucos passos adeante da Caixa Geral Agricola, banco rural com succursaes em todo o paiz, estava o Credito Idustrial, com fachada toda de aço e crystal dava bem a medida dos fins daquelle estabelecimento. Numa linda ornamentação de faiança estylisara o architeto a historia da mecânica desde o singelo plano inclinado com que se construíram as pyramides do Egypto até ºas mais recentes machinas magneto-electricas, que arrebatavam a electricidade das altas camadas atmosphericas para a obrigarem a desempenhar até misteres caseiros bem modestos.
Parecia que as linhas todas destes edificios concorriam para formar como que o ambasamento de uma estatua collossal que o encimava, representando a Sciencia Moderna, por um genio alado, com o pé direito levemente apoiado sobre uma roda de cujos cubos saiam jactos de vapor. Na mão esquerda um pouco levantada acima da cabeça empunhava uma pilha, cujos reopharos rodeando-lhe o busto em graciosas curvas se ramificavam, já para a lampada, já para machinas diversas espalhadas em volta da roda sobre que poisava o pé. Eram theares mechanicos, eram turbinas de vapor, eram locomotivas, eram perfuradores, numa palavra eram os mil engenhos por meio dos quaes o homem multiplica as suas forças.
Em frente destes edificios, do lado opposto da rua, encontrava-se a Cooperativa Geral Edificadora, poderosa sociedade a quem se deviam as mais importantes construções da moderna Lisboa. Era ao mesmo tempo uma empreza de engenharia e architetura e um estabelecimento bancario. Estavam-lhe associados os mais importantes construtctores do paiz e os maiores capitalistas.
(...)
Comtudo, aquella empreza prosperára enormemente e nenhum constructor deixava de recorrer a ella, porque todos os materiaes por ella fornecidos eram garantidos por analyses e ensaios, que se effectuavam nos laboratorios do proprio estabelecimento.
Neste edificio não predominava o metal como no Credito Industrial, nem a pedra como na Caixa Geral Agricola. Todos os materiaes de construcção concorriam para dar um conjuncto harmonico a uma obra em que era preciso mostrar que de todos se sabia lançar mão.
O que mais avultava na fachada desta edificação era uma larga janella occupando a altura de tres andares, encimada por um arco Tudor e vedada toda por uma vidraça de vidros deiversamente coloridos.
Não era uma estatua allegorica ou um busto que encimava este edificio, mas um frontão em cujo tympano estavam representadas todas as artes constructivas cooperando numa construcção. Era a Geometria traçando um plano, o Calculo justificando-o, a Mechanica applicada pondo-o em execução, com auxilio da pintura, da architectura, da esculptura, das artes mechanicas, das sciencias physicas e chimicas e pairando sobre a labuta representada por todo este trabalho, a Abundancia derramando a flux tudo a riqueza e o bem estar." (221-223)
