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Texto da entrada (ID.651)

A segunda conferencia que hontem realisou no Atheneu commercial o sr. tenente coronel Francisco Affonso de Chaves, digno director dos serviços meteorologicos nos Açores – relativa, esta, previsão do tempo e tremores de terra – torna perfeitamente opportuno o texto de um relatorio, ultimamente publicado no “Diario do Governo”. Como o thema da conferencia tem a mais estreita relação com o objecto d’esse relatorio na parte referente á previsão de tempo, d’ali nos apressamos a reproduzir o interessante assumpto:

Desde as mais remotas epochas se tem procurado prever o tempo com grande antecedencia.

Durante seculos tal desejada e ainda não conseguida previsão foi baseada especialmente na observação das posições do Sol, da Lua e de alguns planetas; e assim a meteorologia esteve por muito tempo associada, ou antes confundida, com a astronomia. Ainda hoje, entre nós, é vulgar confundirem, mesmo pessoas de alguma illustração, um observatorio astronomico com um metereologico.

Descobertas as leis que regem o systema solar e mais tarde inventado o barometro e o thermometro. Instrumentos que permittiram conhecer as variações da pressão atmospherica e a temperatura do ar, a astronomia e a meteorologia de todo se separaram.

Não caminharam, porem, desde então as suas sciencias a par nos seus progressos, pois se grandes foram os realizados na astronomia, e d’ahi a auctoridade scientifica que alcançou, o mesmo não tem succedido na meteorologia.

Assim, em nenhum povo civilizado tem hoje acceitação uma previsão de um eclipse do Sol, ou da Lua, de uma occultação de um estrella por um planeta, ou de qualquer outro phenomeno celeste, se ella não for baseada em rigorosos processos scientificos, emquanto que as indicações que se encontram em centenares de publicações (falta de tinta no jornal)

Se tal fizessem, saberiam que os methodos empregados para assim ser previsto o tempo, ou são completamente empiricos, mesmo sem uma base pseudo-scientifica, que lhes sirva de justificação, ou são tão extraordinarios, como o de Lamprecht, que depois de demoradas investigações reconheceu o haver cinco periodos nos quaes os phenomenos atmosphericos se reproduzem, periodos que duram respectivamente os seguintes dias: 12 1/9, 12 23/30, 13 9/11, 14 ¾ e 29 3/7, e que são determinados pela rotação e relativa posição de cinco aneis atmosphericos (analogos aos de Saturno), que rodeiam a terra, aos quaes o mesmo autor deu os nomes de Rei Alberto, Copernico, Bismarck, Moltke e Imperador Guilherme!

Saberiam mais que os methodos: de Zenger, baseado no movimento de rotação do Sol sobre o seu eixo, originando assim de treze em treze dias (cêrca de metade do periodo de tal rotação) epocas de mau tempo, ás quaes se seguem dias de bom tempo; o de Servus, que não só recorre ao Sol e à Lua, como bases da previsão de tempo, mas a perturbações que succedem no poder attractivo da massa interior da terra; e, finalmente, os de Demtschinsky, Rodriguez, Gladbach, etc., baseados só na influencia da Lua sobre a atmosphera terrestre, saberiam que nenhum d’estes methodos assenta sobre uma base segura e de valor scientifico, mas só teem acceitação por tenderem a satisfazer o insaciavel desejo humano de conhecer, de explicar, o que lhe é desconhecido.

A estes methodos tão falazes poderá a sciencia oppor outro de valor?

É o que vou procurar expor com relação á previsão de uma tempestade, insistindo mui particularmente na importancia meteorologica dos Açores.

Depois da invenção do barometro, notou-se que a altura da columna barometrica não só variava quando se transportava tal instrumento de um logar para outro que não estivesse no mesmo nivel mas que tal variação tambem se observava com as mudanças do tempo.

Verificou-se mais que geralmente com o mau tempo havia uma baixa barometrica e que o bom tempo succedia quasi sempre a uma alta.

Mais tarde outros dois instrumentos, o thermometro e o hygeometro, o primeiro indicando nos as variações da temperatura do ar, e o segundo as da humidade, passaram a ser empregados como auxiliares da previsão do tempo, feita até ali só com o barometro, porquanto a elevação de temperatura e o aumento de humidade no ar, ou o decrescimento dos mesmos elementos, coincidindo respectivamente com o abaixamento ou a subida da columna barometrica, são indicações importantes, são indicações importantes, quando haja conjugação, de probabilidade de mau tempo no primeiro caso e de bom tempo na segunda.

Estes principios, estabelecidos ha mais de dois seculos, são ainda hoje empregados commumente para prever o tempo com antecedencia de horas, ou o maximo de um dia; e até 1855 foram elles os usados nos institutos meteorologicos, apesar de então já ser conhecida a theoria da circulação das tempestades, da sua deslocação ordinaria de oeste para leste, no hemispherio boreal; de uma região de calma no centro da tempestade, etc; o que já devia permittir haver um melhor methodo de previsão do tempo.

Só em 1855, aproveitando a vantagem de se poderem rapidamente centralisar, por meio das communicações telegraphicas, observações meteorologicas feitas no mesmo dia em pontos muito distanciados uns dos outros, só em tal epoca, a meteorologia começou a dar resultados praticos.

Foi desde então que, comparando taes observações, se reconheceu:

1º O não estar a altura barometrica, sómente relacionada com a situação atmospherica do logar onde está o barometro, mas, em geral, com a de uma grande superficie da Terra.

2º Haver certas regiões terrestres onde a pressão atmospherica é em geral mais elevada do que noutras, de modo que é necessario conhecer a altura media da columna barometrica nessas regiões para d’ahi se inferir quando ellas estejam num regime de altas ou baixas pressões.

3º Ser a pressão atmospherica minima indicadora do ponto central da depressão em torno da qual o ar gira.

4º Não serem immoveis as areas de menor pressão atmospherica (depressões em meteorologia), deslocando-se ás vezes tão pouco que parecem estar immoveis, mas geralmente succedendo o percorrerem de 28 a 40 kilometros por hora e raramente 80 kilometros, deslocação que se faz não em direcção constante, parando ás vezes bruscamente e até desapparecendo taes depressões quasi que repentinamente.

Continua


Referência bibliográfica

Francisco Afonso Chaves - "Previsão do Tempo - Relatorio acerca do serviço meteorologico dos Açores durante o anno de 1904" in Diário dos Açores de 13 de Maio de 1910, nº. 5664, p. 1 (col. 1-3). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=651.



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Astronomia
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