5º Em todas as depressões no hemispherio boreal o movimento giratorio do ar effectua-se no sentido inverso d’aquelle que seguem os ponteiros de um relogio.
6º Ser a força do vento entre dois pontos, tanto maior quanto maior for a differença da altura da columna barometrica, entre ellas, depois de tal altura ser reduzida ao mesmo nivel (o do mar) e temperatura. [1]
7º A aproximação ou o afastamento de uma depressão de qualquer logar ser tanto mais rapida, quanto mais rapidamente baixa ou sobe a columna barometrica.
8º Que, “se virarmos as costas ao vento, teremos a mais baixa pressão á esquerda e a mais alta pressão á direita” (lei de Buys Ballot).
Um exemplo mostrará a applicação dos mais importantes d’estes principios.
Supponhamos que temos na Europa tres logares A, B e C, situados respectivamente de oeste para leste, em latitude pouco differente, sendo A collocado mais ao norte e C mais ao sul, ficando B igualmente distanciado de A e C cêrca de 240 kilometros, o que succede nos Açores, com a Villa de Santa Cruz, na Ilha das Flores (A), e as cidades da Horta (B) ao Faial, e de Ponta Delgada (C) em S. Miguel.
De C queremos fazer a previsão do tempo, servindo-nos das observações meteorologicas feitas neste ponto, e das feitas em A e B.
Nos tres pontos observou-se á mesma hora local (a differença da hora entre A e B e B e C é muito pequena, só de 11 minutos) que o vento sopra do sul, e que a pressão atmospherica é de 760,5 millimetros em A, de 763 millimetros em B e de 764,5 millimetros em C.
Em virtude dos principios indicados sabemos:
1º Que ha tendencia para a aproximação de uma depressão, pois a pressão atmospherica decresce de C para A, sendo mesmo em C de 764,5 millimetros, portanto inferior á de 766 millimetros, pressão media na região considerada.
2º Que o centro da depressão paira aproximadamente a oeste dos alludidos pontos, visto que o vento é do sul (lei de Buys-Ballot).
3º Que entre A e B a differença de pressão é de 2,5 millimetros, e portanto, como estes dois pontos ficam distanciados aproximadamente 240 kilometros, o gradient é de cerca de 1 millimetro, e por motivo analogo de 7 decimos de millimetro o gradient entre B e C, devendo por isso ir augmentando a força do vento de A para C.
No dia immediato o vento continua do sul nos tres pontos, mas as pressões diminuiram, sendo de 749 millimetros em A, de 757,5 millimetros em B e de 762 millimetros em C.
Vemos por estes elementos que a depressão acima mencionada se aproxima rapidamente (baixa rapida do barometro), com probabilidade de haver ventos tempestuosos em toda a região, considerada, pois já entre A e B o gradient é de 4 millimetros e de um pouco mais de 2 entre B e C.
Horas depois sabe-se telegraphicamente que em A ás 7 horas da manhã o vento rondou do sul por sueste para leste, vento tempestuoso, e que o barometro começou então a subir rapidamente, tendo chegado ao minimo de 730 millimetros.
Á mesma hora a pressão em B era de 741 millimetros, e o vento lessueste, e em C a pressão de 650 millimetros, com vento do sul. O gradient entre A e B é, pois, de 5 millimetros, e de 4 entre B e C.
O salto do vento do sul para oeste, e o começo da subida do barometro em A, são as primeiras indicações que nos permittem prever que a depressão, cujo centro passou ás 7 horas da manhã por um ponto proximo de A, d’elle se vae afastando na direcção de B, e que provavelmente a tempestade não passará perto d’este ponto, ou por elle, antes de 1 hora da tarde (imaginando que ella se desloca com a velocidade da translação de 40 kilometros por hora, velocidade que já é grande), e cerca das 7 horas da noite por C.
O que mais agora interessa saber em C é quando o barometro cessa de descer em B, ali ronda o vento, e em que direcção.
Ás 2 horas da tarde sabemos que acaba o vento de rondar em B de lessueste para nordeste, pelo leste, e que o barometro logo começou a subir rapidamente, tendo chegado ao minimo de 727 millimetros.
A tal hora o vento em C é do sul, e a pressão atmospherica de 740 millimetros, portanto o gradient entre B e C de 6 millimetros.
Com estes elementos concluimos:
1º que a velocidade de translação da tempestade foi de cerca de 34 kilometros por hora, visto que em 7 horas percorreu a distancia de 240 kilometros, que separa A de B.
2º Que o centro da depressão passou mais proximo de B do que de A, o que conhecemos por ter o barometro indicado n’este ultimo ponto uma pressão (730 millimetros) superior á indicada em B (727 millimetros).
3º Que a tempestade passou ao sul de A e de B, porquanto em ambos os pontos o vento rondou quando o centro da depressão se começou a afastar (começo da subida barometrica) do sul e do lessueste para o oeste e nordeste (lei de Buys Ballot).
Continua pois a confirmar-se a previsão feita, e assim é de esperar que a tempestade passe por C d’ahi a poucas horas, e que o vento aumente de intensidade, pois o gradient tem crescido.
Ás seis horas e meia da tarde começou a subir rapidamente o barometro em C, soprando então o vento com grande violencia, rondando o vento do sul para noroeste pelo oeste, tendo o barometro indicado a pressão minima de 725 millimetros.
Sabemos assim:
1º Que a velocidade de translação da tempestade foi menor entre A e B do que entre B e C (35 kilometros por hora n’este caso).
2º Que a trajectoria da tempestadae se desviou para nordeste, pois o vento, que em A e B rondou no sentido inverso aos dos ponteiros de um relogio, em C rondou naquelle sentido, seguindo por isso, a tempestade ao norte de C (lei de Buys Ballot).
3º Que o centro da depressão se aproximou mais de C do que de A ou B (minima barometrica de 725 millimetros), mas que não passou por C, pois a assim succeder devia ter-se ali observado a passagem do vento por todos os quadrantes, o que não succedeu, tendo só ido do sul até noroeste.
Como todos estes elementos meteorologicos são telegraphados para as estações meteorologicas do continente europeu, e dos Estados Unidos, ás quaes importa conhecer a situação atmospherica de tão importante região do Atlantico, como a dos Açores, ficam ellas sabedoras de tal situação, que algumas vezes combinada com a de outros pontos do Atlantico, e da Europa, lhes permitte fazer com segurança a respectiva previsão do tempo, para os seus paizes, e para o Atlantico.
Continua
[1] A unidade de distancia empregada em meteorologia para esta differença de altura barometrica é a de um grau de esfera terrestre (cerca de 111 kilometros), e tal differença para esta distancia chama-se gradient. Assim, se entre dois pontos afastados de 333 kilometros a differença barometrica fôr de 6 millimetros, o gradient é de 2.
Um gradient superior a 3 millimetros indica vento tempestuoso.
Francisco Afonso Chaves - "Previsão do Tempo - Relatorio acerca do serviço meteorologico dos Açores durante o anno de 1904 "
in Diário dos Açores
de 14 de Maio de 1910, nº. 5665, p. 1 (col. 1-3). Disponível em linha em http://bd-divulgacaocientificaemjornais.ciuhct.org/entrada.php?id=655.